1. Morte de adolescente por atropelamento por ônibus escolar;
2. Propositura de ação indenizatória (danos morais) por parte da mãe e dos irmãos da vítimia;
3.
Decisão primeiro grau a) extinção do processo sem julgamento do mérito,
em relação aos irmãos, sob o fundamento de ilegitimidade ativa
(carência da ação, com base no art.
267,
IV do
CPC - quando se verificar a ausência de pressupostos de
constituição
e de desenvolvimento válido e regular do processo; b) procedência
parcial no que pertine ao pleito da mãe, com fixão de indenização no
montante de 300 salários mínimos e pensão mensal equivalente a 2/3 do
salário mínimo, até data em que a vítima completasse 65 anos;
4.
Apelação (ator e réu) perante o TJ/DF acórdão ratifica sentença de
primeira instância e mantém extinção do processo em relação aos irmãos,
por ilegitimidade. O fundamento: não há entre irmãos, a relação de
reciprocidade na prestação de alimentos. Em outras palavras, ausente a
relação de dependência econômica. Redução do valor da indenização (para
200 salários mínimos) e redução para 25 anos do termo final da pensão
mensal (pois, não haveria de se falar em danos materiais, já que a
vítima não exercia, à epoca do acidente, atividade remunerada);
5.
REsp impetrado pelo Ministério Público (MP como custus legis) pelo
reconhecimento da legitimidade ativa dos irmãos para o ajuizamento da
ação de dano moral indireto. Fundamentos para o recurso: violação aos
art.
3º e
46,
II e
IV do
CPC.
A
decisão proferida pelo Tribunal da Cidadanis, traz em seu bojo, a
celeuma relacionada à (in) legitimidade de familiares que sofrem com a
morte de parente próximo, ajuizarem ação indenizatória danos morais em
razão da perda deste ente. Trata-se do que a doutrina intitula de danos
morais indiretos ou por ricochete.
Falamos em morte, mas, é
importante ressaltar que esta modalidade de danos morais não se
restringe à hipótese de morte, somente. Alcança, também, os casos em que
as vítimas, embora não tenham ido a óbito, sofram com as sequelas da
lesão. Pensando no mesmo caso, hipótese em que a vitima do atropelamento
não viesse a falecer, mas, passasse a sofrer de paralisia (paraplegia).
Os danos morais se classificam em: a) direito ou indireto; b)
puros ou reflexos. Fala-se em dano moral direto quando a lesão atinge
bem jurídico extra-patrimonial, como a integridade física, corporal,
moral, dentre outros. Relacionam-se, assim, com os direitos da
personalidade. Já os indiretos se caracterizam pela ofensa a bem
jurídico patrimonial, mas, com repercussão extra-patrimonial.
Puro
é o dano que atinge a própria vítima. Reflexo ou por ricochete, é
aquele que atinge a terceiras pessoas, em razão do dano pratizado em
relação à vítima. Neste caso, a ofensa/lesão tem como alvo determinada
pessoa, mas, acaba por atingir terceiros.
Nas palavras da Min. relatora Nancy Andrighi,
embora
o ato tenha sido praticado diretamente contra determinada pessoa, seus
efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de
terceiros. É o chamado dano moral por ricochete ou préjudice d'affection
.
Insta-se ressaltar que no direito comparado, a doutrina francesa e alemã admitem a ocorrência desta espécie de dano moral.
O
primeiro julgamento envolvendo o tema (dano moral por ricochete)
aconteceu em 1999 - REsp 160.125 de relatoria do já aposentado, Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira pioneiro a se debruçar sobre o assunto. De
acordo com o entendimento firmado nesta oportunidade, a caracterização
dos chamados danos morais reflexos/indiretos/por ricochete não dependem
da comprovação da depenência econômica entre a vítima e o familiar que
postula a indenização, contrariamente ao preconizado pelo TJ/DF.
A
nosso ver, outro não podia ser o entendimento. Ora, é claro que a dor
provocada pela morte (ou graves sequelas) de um familar pode ser
considerada origem do dever de indenizar. O raciocínio é simples: em se
tratando de dano moral, o que se busca não é, simplesmente, a reposição
do patrimônio e o restabelecimento do status anterior, mas sim, a
compensação da dor. E, de acordo com a posição firmada, nestes casos,
basta a verificação do forte vínculo entre a vítima e os que pleiteiam a
indenização.
No início deste texo, quando do entendimento do
caso em concreto, mencionu-se a interposição do REsp por parte do
Minsitério Público. Tal procedimento pode vir a causar confusão, pois,
como o parquet teria legitimidade recursal em ações de dano moral, ou
seja, direito individual? A fins de esclarecimento, vale lembrar o
entendimento firmado em nossos Tribunais, no sentido de o MP possuir
legitimidade recursal nos processos que envolvam interesse individual,
quando tiver atuado como custus legis. Trata-se da aplicação do disposto
no art.
499,
2º do
CPC
(O recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro
prejudicado e pelo Ministério Público. 2º O Ministério Público tem
legitimidade para recorrer assim no processo em que é parte, como
naqueles em que oficiou como fiscal da lei).
Autor: Patrícia Donati de Almeida (Extraído de:
Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
- 11 de Abril de 2011.