A Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal
Superior do Trabalho (TST) manteve decisão que condenou a Sidor
Indústria e Comércio Ltda., de São Paulo, a indenizar um torneiro
mecânico que teve um dedo amputado em acidente de trabalho. O
entendimento da maioria dos ministros foi o de que a atividade de
torneiro mecânico é de risco, dispensando a comprovação de culpa da
empresa pelo acidente que causou a amputação.
A
Sidor, condenada pela Sexta Turma do TST a pagar R$ 5 mil ao operário a
título de indenização por dano moral, recorreu à SDI-1 argumentando
que, nos termos do artigo 7º, inciso XXVIII, da Constituição da República,
só haveria obrigação de reparar o dano se o acidente fosse resultado de
procedimento doloso ou culposo de sua parte, o que não teria ocorrido
no caso. Para a empresa, não caberia a aplicação da responsabilidade
objetiva (que independe de culpa) pelo risco da atividade.
Acidente
O
acidente ocorreu quando o trabalhador trocava a pastilha do torno
mecânico e, ao levar um choque, acionou por reflexo a alavanca da
máquina. Seu dedo indicador da mão direita ficou preso no torno e foi
arrancado. O membro foi reimplantado com sucesso, mas o operário alegou,
na reclamação trabalhista ajuizada contra a empresa, que as sequelas do
acidente reduziram sua capacidade de trabalho, impedindo-o de carregar
peso e de trabalhar em ritmo intenso.
O
pedido de indenização por dano moral foi sucessivamente rejeitado pelo
juízo da 2ª Vara do Trabalho de Sorocaba e pelo Tribunal Regional do
Trabalho da 2ª Região (SP). De acordo com a sentença, mantida pelo
Regional, a ausência de ato ilícito por parte do empregador exclui um
dos requisitos para a concessão da indenização, nos termos do artigo 927
do Código Civil.
A
decisão foi reformada pela Sexta Turma do TST no exame de recurso de
revista do trabalhador, que condenou a Sidor a indenizá-lo em R$ 5 mil. O
fundamento foi a teoria do risco da atividade econômica, prevista no
artigo 2º da CLT,
e o mesmo artigo 927 do Código Civil, que, no parágrafo único, prevê a
obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, quando a
atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem.
"O
risco, por óbvio, diz respeito à saúde e à higidez física do
trabalhador", afirmou, no acórdão da Turma, o relator do recurso,
ministro Aloysio Corrêa da Veiga, ressaltando que a norma deixa ao
julgador a tarefa de decidir o que pode ser reconhecido como atividade
de risco. Ele considerou estar claro, no caso, de que os problemas do
trabalhador foram gerados na empresa, e que sua exposição aos fatores
biomecânicos exigidos pela atividade, não havendo dúvida quanto ao nexo
causal. "Logo, a culpa empresarial se presume em face das circunstâncias
adversas que deram origem ao malefício", concluiu.
Atividade de risco
No
julgamento dos embargos da empresa contra a decisão da Sexta Turma, a
SDI-1 discutiu se a atividade do torneiro mecânico poderia ser
classificada como de risco, e se caberia a aplicação ao caso da teoria
da responsabilidade objetiva. O relator, ministro Ives Gandra Martins
Filho, votou no sentido de acolher a argumentação da empresa.
Ele
destacou, em seu voto, que a SDI-1 já considerou a responsabilidade
objetiva com base na atividade de risco em diversas situações: um
técnico de informática que tinha de se deslocar em rodovias, um bancário
acometido de LER/DORT, motoristas profissionais, de ônibus ou de
transporte rodoviário de carga, trabalhadores de minas de subsolo, de
manutenção de rede elétrica e transporte de valores e vigilantes, entre
outros.
"Como
se vê, a função de torneiro mecânico não pode ser considerada de
risco", afirmou, assinalando que o Regional considerou que o acidente
"foi uma fatalidade, um ato do acaso ou um descuido do empregado", uma
vez que ficou demonstrado que havia manutenção regular nas máquinas e
ambiente seguro e saudável no trabalho. Diante da ausência de
demonstração de culpa da empresa, o ministro julgou incabível a
indenização.
O
ministro Aloysio Corrêa da Veiga, porém, abriu a divergência que acabou
fixando a tese vencedora. Retomando os fundamentos adotados na decisão
da Sexta Turma, ele insistiu no entendimento de que a atividade, por si
só, é de risco – sobretudo devido ao alto número de acidentes com tornos
mecânicos.
Corrêa
da Veiga ressaltou que o torneiro mecânico usa máquinas "com potencial
ofensivo, em que a simples operação pode causar o dano", o que, a seu
ver, caracteriza a culpa presumida da empresa. "Desde a década de 70
esse tipo de lesão ocorre repetidamente, e isso é estatisticamente
comprovado", afirmou. "O grande problema é a repetição do acidente e o
potencial ofensivo da máquina".
A
tese divergente, que negava provimento aos embargos, foi seguida pela
maioria dos ministros da SDI-1. Ficaram vencidos os ministros Ives
Gandra Martins Filho (relator), Brito Pereira, Renato de Lacerda Paiva e
Dora Maria da Costa, que davam provimento para absolver a empresa da
indenização por dano moral.
(Carmem Feijó)