sexta-feira, 1 de abril de 2022

STJ - Quarta Turma mantém indenização de R$ 100 mil a paciente que desenvolveu escaras (upp - úlceras por pressão) durante internação

Quarta Turma mantém indenização de R$ 100 mil a paciente que desenvolveu escaras durante internação


DECISÃO - STJ

01/04/2022 07:25

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, manteve a obrigação de um hospital indenizar uma paciente em R$ 50 mil por danos morais e R$ 50 mil por danos estéticos, em razão de úlceras por pressão (escaras) que ela desenvolveu por falta de movimentação no leito durante o período em que ficou internada.

Ao negar provimento ao recurso especial interposto pelo hospital, o colegiado considerou que o valores arbitrados pelas instâncias ordinárias não foram exorbitantes ou desproporcionais aos danos suportados pela paciente.

O hospital foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) em ação indenizatória ajuizada pela paciente. Ao STJ, o hospital alegou que os valores dos danos morais e estéticos foram exorbitantes. Também sustentou que não teria responsabilidade no caso, pois não haveria culpa nem nexo causal entre sua conduta e as lesões.

Paciente ficou com deformações e adquiriu sarna

Relator do recurso, o ministro Raul Araújo lembrou que, de acordo com a jurisprudência do STJ, a revisão dos valores de danos morais e estéticos só é possível em hipóteses excepcionais, quando tiverem sido fixados em nível exorbitante ou insignificante, violando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Na avaliação do magistrado, não é possível a revisão dos valores fixados no caso em análise, uma vez que não foram "irrisórios nem desproporcionais aos danos sofridos" pela paciente, decorrentes de falha na prestação do serviço hospitalar.

O ministro destacou que, durante a internação, as escaras surgidas na paciente pioraram porque o tratamento foi iniciado tardiamente, e acabaram exigindo a realização de mais de uma cirurgia. A mulher ficou com cicatrizes e deformações, que afetaram sua vida pessoal, e ainda adquiriu sarna enquanto esteve no hospital.

"Nesse contexto, os valores de indenização não se mostram desproporcionais ou exorbitantes, não se verificando a excepcionalidade capaz de justificar a revisão pelo STJ", afirmou o relator.

Provas demonstraram a falha do hospital

Acerca da ausência de responsabilidade alegada pela instituição hospitalar, Raul Araújo observou que o TJRJ, após analisar as provas – incluindo um laudo pericial –, reconheceu a falha na prestação do serviço, uma vez que as lesões foram causadas pela falta de movimentação da paciente no leito e de medidas preventivas.

De acordo com o ministro, a reforma do acórdão recorrido demandaria o reexame de fatos e provas, o que é inviável no recurso especial, como estabelecido pela Súmula 7 do STJ.

Leia o acórdão no AREsp 1.900.623.

(Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/01042022-Quarta-Turma-mantem-indenizacao-de-R--100-mil-a-paciente-que-desenvolveu-escaras-durante-internacao.aspx>. Acesso em 01.04.2022 

AREsp 1900623

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

STF - Ministro Alexandre de Moraes assegura a entes públicos legitimidade para propor ação por improbidade! Vale a pena conferir :)

STF - Ministro Alexandre de Moraes assegura a entes públicos legitimidade para propor ação por improbidade

Para o ministro, a supressão da legitimidade, introduzida por mudanças na Lei de Improbidade Administrativa, caracteriza uma espécie de monopólio do combate à corrupção ao Ministério Público não autorizado pela Constituição Federal.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar para definir que, além do Ministério Público, as pessoas jurídicas interessadas têm legitimidade para propor ação por ato de improbidade administrativa. A decisão foi tomada nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7042 e 7043, ajuizadas, respectivamente, pela Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape) e pela Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais (Anafe). A decisão será submetida a referendo do Plenário.

As entidades questionam dispositivos da Lei 14.230/2021, que alterou a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992). Um dos questionamentos é que a nova legislação, ao assegurar apenas ao Ministério Público a legitimidade para ajuizar ação de improbidade, suprimiu essa prerrogativa dos entes públicos lesados, impedindo o exercício do dever-poder da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios de zelar pela guarda da Constituição e das leis e de conservar o patrimônio público. Alegam, ainda, afronta à autonomia da Advocacia Pública, tendo em vista que os entes políticos ficarão "à mercê da atuação do Ministério Público para buscar o ressarcimento do dano ao erário”.

Comando impeditivo à exclusividade

Em sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que o artigo 129, parágrafo 1º, da Constituição Federal estabelece, expressamente, que a legitimação do Ministério Público em ações civis de improbidade administrativa não impede a de terceiros. Em seu entendimento, o dispositivo do texto constitucional parece indicar um comando impeditivo à previsão de exclusividade do Ministério Público nesses casos.

De acordo com o ministro, o combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no poder público, com graves reflexos na carência de recursos para a implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados.

Em análise preliminar do caso, o relator destacou que a supressão da legitimidade ativa das pessoas jurídicas interessadas para a propositura da ação de improbidade pode representar grave limitação ao amplo acesso à jurisdição, ofensa ao princípio da eficiência e obstáculo ao exercício da competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios para “zelar pela guarda da Constituição” e “conservar o patrimônio público”. Essa supressão, segundo ele, caracteriza uma espécie de monopólio absoluto do combate à corrupção ao Ministério Público, não autorizado, entretanto, pela Constituição Federal.

Outros dispositivos

A liminar concedida pelo ministro também suspende dispositivo que obriga a assessoria jurídica que emitiu o parecer atestando a legalidade prévia dos atos administrativos a defender o administrador público que venha a responder ação por improbidade administrativa.

Também fica suspenso o artigo 3° da Lei 14.230/2021, que estabelecia o prazo de um ano, a partir da data de publicação da norma, para que o Ministério Público competente manifestesse interesse no prosseguimento das ações por improbidade administrativa em curso ajuizadas pela Fazenda Pública e que paralisava, durante esse prazo, os processos em questão.


EC/AD//CF

Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=481960&ori=1>. Acesso em 18.02.2022 

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

STJ - Após prazo decadencial, execução de sentença arbitral não pode ser impugnada por nulidades previstas na Lei de Arbitragem. INTERESSANTE!

Após prazo decadencial, execução de sentença arbitral não pode ser impugnada por nulidades previstas na Lei de Arbitragem

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que não é cabível a impugnação ao cumprimento da sentença arbitral, com base nas hipóteses de nulidades previstas no artigo 32 da Lei 9.307/1996, após o prazo decadencial de 90 dias – o período é contado a partir do recebimento da notificação sobre o julgamento arbitral.

O colegiado negou provimento a recurso interposto por uma empresa consorciada no qual se alegou que o pedido de nulidade da sentença arbitral – apresentado em incidente de impugnação ao cumprimento de sentença – também pode ser realizado no prazo de 15 dias previsto no artigo 525 do Código de Processo Civil.

O consórcio do qual a empresa faz parte foi condenado pelo tribunal arbitral ao pagamento de mais de R$ 3,2 milhões a outro consórcio pelo descumprimento de um contrato de fornecimento de materiais e equipamentos.

As condenadas apresentaram impugnações ao cumprimento de sentença, mas elas foram rejeitadas nas instâncias ordinárias, que reconheceram a fluência do prazo decadencial de 90 dias para suscitar a nulidade da sentença arbitral, ainda que veiculada em impugnação ao cumprimento de sentença; bem como reconheceram a responsabilidade solidária entre as empresas do consórcio.

Pretensão para anular sentença arbitral deve ser feita no prazo de 90 dias

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que o estabelecimento da convenção de arbitragem subtrai do Poder Judiciário não apenas a competência para conhecer originariamente do conflito de interesses surgido entre as partes, mas, também, em momento posterior, para se ingressar no mérito da decisão exarada pelo tribunal arbitral que decidiu o litígio.

Segundo o magistrado, à parte sucumbente é possível veicular, perante o Poder Judiciário, a pretensão de anular sentença arbitral, desde que fundada nas hipóteses taxativas – todas de ordem pública –, especificadas no artigo 32 da Lei 9.307/1996, e desde que o faça de imediato, no prazo decadencial de 90 dias.

O magistrado esclareceu que a Lei de Arbitragem estabelece, para tal pretensão, o manejo de ação anulatória (artigo 33, caput) e, nos casos em que há ajuizamento de execução de sentença arbitral (artigo 33, parágrafo 3º), a lei prevê a possibilidade de impugnação ao seu cumprimento – desde que observado, em ambos os casos, o prazo decadencial nonagesimal.

Vedação à nulidade da sentença arbitral após o prazo decadencial

Bellizze ressaltou que não há respaldo legal que permita à parte sucumbente – que não promoveu a ação de anulação da sentença arbitral no prazo de 90 dias – manejar a mesma pretensão anulatória, agora em impugnação à execução ajuizada em momento posterior a esse lapso, sobretudo porque, a essa altura, o direito potestativo (de anular) já terá se esvaído pela decadência.

"Por consectário, pode-se afirmar que a veiculação da pretensão anulatória em impugnação só se afigura viável se a execução da sentença arbitral for intentada, necessariamente, dentro do prazo nonagesimal, devendo a impugnante, a esse propósito, bem observá-lo, em conjunto com o prazo legal para apresentar sua peça defensiva", afirmou.

O ministro também lembrou que, segundo precedente da Terceira Turma, embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo artigo 525, parágrafo 1º, do CPC, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no artigo 32 da Lei 9.307/1996.

Responsabilidade solidária reconhecida no juízo arbitral

Em relação à responsabilidade das empresas consorciadas, o relator verificou que, no caso, a sentença arbitral, tanto em sua introdução, em que se reportou ao contrato de constituição do consórcio – no qual há expressa previsão de solidariedade entre as consorciadas –, quanto em sua parte dispositiva, sobre a qual recaem os efeitos da coisa julgada, estabelece a condenação das requeridas, sem nenhuma especificação.

Na avaliação do relator, a pretensão para individualizar a responsabilidade entre as empresas resultaria na modificação do mérito da sentença arbitral – providência que o Judiciário não está autorizado a realizar.


Disponível em:<https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/10022022-Apos-prazo-decadencial--execucao-de-sentenca-arbitral-nao-pode-ser-impugnada-por-nulidades-previstas-na-Lei-de-.aspx>. 
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1862147

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Os meios atípicos de execução: hipóteses, requisitos e limites, segundo o STJ

Os meios atípicos de execução: hipóteses, requisitos e limites, segundo o STJ

Entre um credor interessado em receber e um devedor que não se dispõe a pagar voluntariamente, há uma série de mecanismos oferecidos pela legislação para que o Judiciário possa solucionar o litígio. Além dos meios de execução típicos ou diretos – como o bloqueio de valores em conta e a penhora de outros bens –, o Código de Processo Civil, no artigo 139, inciso IV, deu poderes ao juiz para adotar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para garantir ao credor a satisfação de seu direito.

A partir desse dispositivo, extrai-se a possibilidade de que sejam utilizados os chamados meios atípicos de execução, medidas consideradas de coerção indireta e psicológica para obrigar o devedor a cumprir determinada obrigação. Entre as medidas que a Justiça vem adotando com essa finalidade estão a apreensão de documentos e o bloqueio de cartões de crédito.

Os meios de execução atípicos geraram um intenso debate sobre as condições e os limites de sua utilização, e várias dessas controvérsias já chegaram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Meios atípicos são subsidiários aos instrumentos típicos

No julgamento do REsp 1.864.190, a Terceira Turma estabeleceu que os meios de execução indireta previstos no artigo 139, inciso IV, do CPC têm caráter subsidiário em relação aos meios típicos e, por isso, o juízo deve observar alguns pressupostos para autorizá-los – por exemplo, indícios de que o devedor tem recursos para cumprir a obrigação e a comprovação de que foram esgotados os meios típicos para a satisfação do crédito.

Na execução em análise, o credor pediu a adoção de medidas como a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), a apreensão do passaporte e o cancelamento de cartões de crédito do devedor. Os pedidos foram negados em primeiro e segundo graus.

A ministra Nancy Andrighi explicou que, no CPC/2015, o legislador optou por conferir maior elasticidade ao desenvolvimento da execução, de acordo com as circunstâncias de cada caso. Todavia, a magistrada ponderou que isso não significa que qualquer modalidade executiva possa ser adotada de forma indiscriminada, sem balizas ou meios de controle efetivos.

Além disso, a relatora apontou ser necessário diferenciar a natureza jurídica das medidas de coerção psicológica (que são apenas medidas executivas indiretas) em relação às sanções civis de natureza material – essas últimas com capacidade de ofender a proteção patrimonial, já que configuram sanções em razão do não pagamento da dívida.

"A diferença mais notável entre os dois institutos enunciados é a de que, na execução de caráter pessoal e punitivo, as medidas executivas sobre o corpo ou a liberdade do executado têm como característica substituírem a dívida patrimonial inadimplida, nela sub-rogando-se, circunstância que não se verifica quando se trata da adoção de meios de execução indiretos", esclareceu a ministra.

Mecanismos atípicos pressionam o devedor para quitar a obrigação

Citando lições da doutrina, Nancy Andrighi ressaltou que a adoção de medidas executivas coercitivas que recaiam sobre a pessoa do executado não significa que seu corpo passa a responder por suas dívidas, posto que essas medidas apenas pressionam psicologicamente o devedor para que ele se convença de que o melhor a fazer é cumprir voluntariamente a obrigação.

"Do mesmo modo, não se pode falar em inaplicabilidade das medidas executivas atípicas meramente em razão de sua potencial intensidade quanto à restrição de direitos fundamentais. Isso porque o ordenamento jurídico pátrio prevê a incidência de diversas espécies de medidas até mesmo mais gravosas do que essas", lembrou a ministra, destacando hipóteses como o despejo forçado, a busca e apreensão, e a remoção de pessoas e coisas.

Entretanto, a relatora enfatizou que, para a medida atípica ser adotada, o juízo deve intimar previamente o executado para pagar o débito ou apresentar bens destinados a saldá-lo e, na sequência, caso não haja o pagamento, realizar os atos de expropriação típicos.

Só após o esgotamento prévio dos meios diretos de execução é que, segundo a magistrada, o juízo pode autorizar, em decisão fundamentada, a utilização das medidas coercitivas indiretas – não bastando, como argumento, a mera repetição do texto do artigo 139 do CPC.

"Respeitado esse contexto, portanto, o juiz está autorizado a adotar medidas que entenda adequadas, necessárias e razoáveis para efetivar a tutela do direito do credor em face de devedor que, demonstrando possuir patrimônio apto a saldar o débito em cobrança, intente frustrar sem razão o processo executivo", concluiu a relatora.

Na mesma linha de entendimento, no REsp 1.782.418 e no REsp 1.788.950, a Terceira Turma definiu que as medidas atípicas, sempre em caráter subsidiário, só devem ser deferidas se houver no processo sinais de que o devedor possui patrimônio expropriável, pois, do contrário, elas não seriam coercitivas para a satisfação do crédito, mas apenas punitivas.

Requisitos para apreensão de passaporte e CNH

Nos últimos anos, o STJ tem sido reiteradamente chamado a analisar a validade de decisões judiciais que determinam a retenção de dois documentos em especial: o passaporte e a carteira de habilitação. Nesses casos, a discussão gira em torno das potenciais limitações ao direito de ir e vir e do cabimento dessas medidas no contexto das ações executivas.

Nos colegiados de direito privado, a posição que tem prevalecido é a da possibilidade da retenção ou suspensão dos documentos, desde que por decisão fundamentada e, como destacado anteriormente, após o esgotamento das vias executivas típicas. 

Em 2018, a Quarta Turma firmou precedente importante no sentido de que é ilegal e arbitrária a retenção do passaporte em decisão judicial não fundamentada e que não observou o contraditório.

Relator do recurso, o ministro Luis Felipe Salomão explicou que o STJ reconhece a validade da utilização do habeas corpus para questionar a apreensão de passaporte, como no caso analisado, pois a medida limita a liberdade de locomoção.

Em relação aos instrumentos executivos atípicos, o magistrado lembrou que o mérito das inovações trazidas pelo CPC/2015 foi a preocupação com a efetividade da tutela jurisdicional, mas que essa circunstância não pode afastar as regras constitucionais, em especial a restrição injustificada de direitos individuais.

No caso dos autos, Salomão destacou que o juízo da execução se limitou a deferir o pedido de suspensão do passaporte, sem se preocupar em demonstrar a necessidade e utilidade da medida. Como consequência da falta de fundamentação da decisão e da ausência do exercício do contraditório pelo devedor, o ministro considerou arbitrária a retenção do documento.

"O reconhecimento da ilegalidade da medida consistente na apreensão do passaporte do paciente, na hipótese em apreço, não tem qualquer pretensão em afirmar a impossibilidade dessa providência coercitiva em outros casos e de maneira genérica. A medida poderá eventualmente ser utilizada, desde que obedecido o contraditório e fundamentada a decisão, verificada também a proporcionalidade da providência", apontou o relator (RHC 97.876).

Validade de apreensão de documento diante da blindagem de patrimônio

Com base nesses mesmos requisitos, no HC 597.069, a Terceira Turma manteve a apreensão de passaporte determinada em uma execução de dívida de aluguéis. A medida foi determinada em primeiro grau, após o não pagamento voluntário e o insucesso das tentativas de localização de bens. 

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) confirmou a ordem judicial, mas limitou os seus efeitos até o oferecimento de bens pelo devedor ou a realização de penhora.

No habeas corpus, a defesa alegou que as medidas restritivas seriam ilegais, desproporcionais e arbitrárias, pois somente o patrimônio da devedora deveria responder pelas dívidas, e ela se encontrava em Portugal, impedida de retornar ao Brasil por motivos financeiros.

O ministro Paulo de Tarso Sanseverino destacou que, segundo o próprio advogado, a devedora teria a intenção de morar fora do Brasil. "Pode-se daí extrair uma forma de blindagem do seu patrimônio, não deixando, pelo que se verificou no curso da execução, bens suficientes no Brasil para saldar as obrigações contraídas, e vindo a pretender residir fora do país e para lá levar o seu patrimônio e, quiçá, lá incrementá-lo, o que dificultaria, sobremaneira, o seu alcance pelo Estado-jurisdição brasileiro", ponderou o relator.

O ministro considerou legítimas e razoáveis as medidas coercitivas adotadas pelo juízo da execução.

"Na hipótese de a paciente efetivamente encontrar-se fora do país, tenho que a suspensão de seu passaporte poderá causar efeito não pretendido pelo magistrado originalmente, impondo-se, assim, acaso essa circunstância se confirme, que seja levantada a suspensão transitoriamente apenas para que a paciente retorne ao Brasil, quando então voltará a ter eficácia a suspensão", ressaltou.

Medidas atípicas são inadequadas para execuções fiscais

No âmbito do direito público, a Primeira Turma, ao julgar o HC 453.870, fixou o entendimento de que a apreensão de passaporte em execução fiscal é desproporcional e inadequada à busca da satisfação do crédito.

Segundo o ministro Napoleão Nunes Maia Filho (aposentado), a adoção dos meios indiretos de execução visa não apenas garantir o direito da parte exequente, mas também salvaguardar o prestígio da Justiça, tendo em vista que o não cumprimento de uma decisão judicial atenta contra a sua dignidade.

Entretanto, o relator apontou que essas medidas atípicas se situam eminentemente no mercado de crédito.

"Julgadores que promovem a determinação para que, na hipótese de execuções cíveis, se proceda à restrição de direitos do cidadão, como se tem visto na limitação do uso de passaporte e da licença para dirigir, querem sinalizar ao mercado e às agências internacionais de avaliação de risco que, no Brasil, prestigiam-se os usos e costumes de mercado, com suas normas regulatórias próprias, como força centrífuga à autoridade estatal", disse o ministro.

No caso das execuções fiscais, Napoleão lembrou que o Estado já é "superprivilegiado" em sua condição de credor, dispondo de varas especializadas para a condução das ações, um corpo de procuradores voltado para essas causas e uma lei própria para regular o procedimento (Lei 6.830/1980), com privilégios processuais específicos.

"Nesse raciocínio, é de imediata conclusão que medidas atípicas aflitivas pessoais, tais como a suspensão de passaporte e da licença para dirigir, não se firmam placidamente no executivo fiscal. A aplicação delas, nesse contexto, resulta em excessos", apontou o ministro.

Sanções por improbidade admitem adoção de meios executivos indiretos

Por outro lado, em julho deste ano, a Segunda Turma considerou possível a determinação de medidas atípicas no cumprimento de sentença condenatória por improbidade administrativa.

A tese foi fixada em processo no qual, após várias diligências ao longo de cinco anos, não foi possível recolher o valor referente à sanção pecuniária aplicada ao agente público. Diante disso, o juízo determinou a apreensão da CNH e do passaporte do executado. Em segunda instância, contudo, o tribunal reverteu a decisão, por entender que a medida atentaria contra os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.  

O ministro Herman Benjamin afirmou que, nas ações de improbidade, não é possível admitir a realização de manobras para escapar das sanções pecuniárias impostas pelo Estado, sob pena de as condutas contrárias à moralidade administrativa ficarem sem resposta.

De acordo com o relator, os parâmetros construídos – especialmente pela Terceira Turma, que julga processos de direito privado – para a verificação da validade das medidas atípicas de execução são adequados também para a avaliação dos requisitos na ação de improbidade.

"Consigne-se que a observância da proporcionalidade não deve ser feita em abstrato, a não ser que as instâncias ordinárias expressamente declarem inconstitucional o artigo 139, IV, do CPC/2015. Não sendo o caso, as balizas da proporcionalidade devem ser observadas com referência ao caso concreto, nas hipóteses em que as medidas atípicas se revelem excessivamente gravosas e causem, por exemplo, prejuízo ao exercício da profissão", finalizou o ministro (REsp 1.929.230).

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

REsp 1864190REsp 1782418REsp 1788950RHC 97876HC 597069HC 453870

fonte: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/14112021-Os-meios-atipicos-de-execucao-hipoteses--requisitos-e-limites--segundo-o-STJ.aspx>. Acesso em 16.11.2021


sábado, 30 de outubro de 2021

STJ - Embaraçar investigação de organização criminosa é crime material e pode ocorrer no inquérito ou na ação

Embaraçar investigação de organização criminosa é crime material e pode ocorrer no inquérito ou na ação

Impedir ou embaraçar a investigação de organização criminosa, delito previsto pelo artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013, é crime material, inclusive na modalidade embaraçar – portanto, é possível a condenação pela forma tentada. Esse tipo penal pode ser configurado tanto na fase de inquérito policial quanto na ação penal, após o recebimento da denúncia.

O entendimento foi firmado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar parcialmente acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que manteve a condenação de quatro pessoas por embaraço à investigação de organização criminosa. A corte estadual concluiu que elas atuaram para mudar o depoimento de uma testemunha já na fase judicial e que o ato de embaraçar é crime formal, consumado quando o réu age para perturbar de qualquer modo a investigação, independentemente de conseguir seu objetivo.

Ao recorrer ao STJ, a defesa sustentou – entre outros argumentos – que o tipo penal descrito no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013 trata da conduta de embaraço à investigação, e não de embaraço ao processo judicial. Ainda de acordo com a defesa, a inexistência de mudança no depoimento da vítima configuraria, no máximo, a tentativa de embaraço, devendo ser afastado o delito consumado. 

Investigações ocorrem tanto no inquérito quanto na ação penal

Segundo o relator, ministro Joel Ilan Paciornik, a tese de que a investigação criminal está restrita à fase do inquérito não tem cabimento, pois a apuração dos fatos se prolonga durante toda a persecução penal – que inclui tanto o inquérito policial quanto a ação judicial, após o recebimento da denúncia. "Não havendo o legislador inserido no tipo a expressão estrita 'inquérito policial', compreende-se ter conferido à investigação de infração penal o sentido de persecução penal", afirmou o magistrado.

Além disso, ele destacou que não seria razoável punir de forma mais severa a obstrução das investigações no inquérito do que a obstrução realizada na ação penal.

Mesmo reconhecendo haver diferentes posições doutrinárias a respeito, o ministro considerou que a melhor interpretação quanto à consumação e à tentativa na modalidade embaraçar está no entendimento de que se trata de crime material.

"A adoção da corrente que classifica o delito como crime material se explica porque o verbo 'embaraçar' atrai um resultado, ou seja, uma alteração do seu objeto. Na hipótese normativa, o objeto é a investigação, que pode se dar na fase de inquérito ou na instrução da ação penal, ou seja, haverá embaraço à investigação se algum resultado, ainda que momentâneo e reversível, for constatado", destacou.

Em reforço a essa tese, o relator citou decisão do Supremo Tribunal Federal que recebeu denúncia por tentativa de obstrução à investigação de organização criminosa, reconhecendo como indícios de materialidade e autoria as conversas em que um político discutia com outras pessoas a necessidade de interferir na atividade da polícia durante a Operação Lava Jato.

Novo julgamento para a verificação de tentativa

Sobre o caso em julgamento, Joel Paciornik comentou que a testemunha supostamente assediada pelo réu pode ter ficado embaraçada, mas não há informação de que isso tenha afetado a investigação em curso na fase judicial. Em consequência, a Quinta Turma determinou que seja realizado novo julgamento do recurso de apelação, para a análise da ocorrência da modalidade tentada.

"Forçoso o retorno dos autos ao tribunal de origem para que seja adotada a classificação de crime material e feita nova análise da ocorrência de tentativa em razão do resultado observado no trâmite da ação penal que apura o delito de organização criminosa, com eventuais reflexos na dosimetria da pena", concluiu o relator.

Leia o acórdão do REsp 1.817.416.

Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/28102021-Embaracar-investigacao-de-organizacao-criminosa-e-crime-material-e-pode-ocorrer-no-inquerito-ou-na-acao.aspx>. Acesso em 30.10.2021.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1817416


segunda-feira, 27 de setembro de 2021

STJ - Razoabilidade, proporcionalidade, presunção de inocência: a investigação social em concurso, na visão do STJ

Razoabilidade, proporcionalidade, presunção de inocência: a investigação social em concurso, na visão do STJ.

​Em alguns concursos públicos – especialmente nos órgãos da área de segurança –, é comum a realização da etapa de investigação social, ou sindicância de vida pregressa, com o objetivo de avaliar se a conduta pessoal do candidato é compatível com o cargo que pretende ocupar.

Buscam-se, entre outras, informações sobre condenações criminais e uso de drogas. É imprescindível que os requisitos exigidos para a comprovação da idoneidade do candidato estejam perfeitamente discriminados no edital do certame, respeitando a natureza e a complexidade do cargo, conforme entendimento da administração pública.

Ao julgar casos sobre esse tema, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), respeitando a discricionariedade administrativa, avalia se a decisão que restringiu o ingresso do candidato na etapa de investigação social observou os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e se os aspectos vinculados do ato administrativo estão em plena consonância com o ordenamento jurídico brasileiro.

Na sequência, alguns entendimentos sobre o assunto.

Omissão de informações autoriza eliminaçã​​o do concurso

Ao julgar o AgInt no RMS 60.984, a Primeira Turma reafirmou a jurisprudência do STJ no sentido de que a omissão em prestar informações exigidas pelo edital, na fase de investigação social ou de sindicância da vida pregressa, justifica a eliminação do candidato. A relatoria foi do ministro Benedito Gonçalves.

No caso, um candidato ao cargo de delegado da Polícia Civil teve sua inscrição cancelada na fase de investigação social do concurso, por ter omitido, no questionário de informações pessoais, que havia sido preso em flagrante e encaminhado ao Centro de Correição da Polícia Militar, além de já ter sofrido as penalidades de repreensão e suspensão de 30 dias em virtude de processo administrativo disciplinar.

Em mandado de segurança, o concorrente ao cargo alegou que, posteriormente à sua exclusão do certame, foi inocentado na ação penal que tramitou contra ele. Invocou a aplicação de entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) segundo o qual "viola o princípio da presunção constitucional do estado de inocência a exclusão de certame público de candidato que, na fase de investigação social e criminal, responda a inquérito policial ou a ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória".

Investigação social verifica adeq​​uação ao cargo

O ministro Benedito Gonçalves, rejeitando as alegações do candidato, destacou que a sua eliminação se deveu ao fato de ter omitido informações relevantes para a comissão avaliadora daquela etapa do concurso, em desconformidade com previsão contida no edital, não subsistindo, dessa forma, direito líquido e certo à convocação e nomeação.

O relator acrescentou que, embora o concorrente tenha complementado as informações do questionário em momento posterior, não o fez de forma integral, deixando de tratar de fatos desabonadores, os quais poderiam levar à conclusão de que ele não satisfazia as exigências para o cargo de delegado.

"A investigação social para admissão de candidato a cargos sensíveis, como o de delegado policial, não se restringe à aferição de existência ou não de condenações penais transitadas em julgado, abrangendo, também, a conduta moral e social do candidato, a fim de verificar a sua adequação ao cargo almejado, que requer retidão e probidade", afirmou o magistrado.

Só trânsito em julgado afasta presunção de inocên​​cia

Recentemente, no julgamento do RMS 47.528, a Segunda Turma, seguindo a orientação do STF, deu provimento ao recurso de um candidato para reverter a sua eliminação de concurso para o cargo de policial civil de Mato Grosso do Sul, decorrente da existência de oito inquéritos e uma ação penal em andamento.

O colegiado entendeu que apenas as condenações penais com trânsito em julgado são capazes de constituir impedimento para que um cidadão ingresse, mediante concurso, nos quadros funcionais do estado.

A comissão examinadora considerou que o candidato havia praticado atos tipificados como ilícitos penais, com repercussão social negativa, e que isso comprometeria a segurança e a confiabilidade da instituição policial.

No voto que prevaleceu no julgamento, o ministro Mauro Campbell Marques ponderou que não se admite que "meros boletins de ocorrência, inquéritos policiais, termos circunstanciados de ocorrência ou ações penais em curso, sem condenação passada em julgado, possam ser utilizados como fatores impeditivos" do acesso ao cargo público, "tendo em vista o relevo dado ao princípio constitucional da presunção de inocência".

Além disso, o magistrado lembrou que, no caso, seria indispensável para a configuração de antecedentes desabonadores a presença dos requisitos dispostos no RE 560.900, julgado pelo STF no regime da repercussão geral.

Cadastro de inadimplentes não impede cand​​idato

No julgamento do RMS 30.734, a Quinta Turma (que hoje é competente apenas para processos criminais) reformou decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) que manteve a exclusão de um candidato ao cargo de técnico penitenciário, reprovado na fase de sindicância de vida pregressa por causa do indiciamento em inquéritos policiais e do registro de anotações negativas em cadastro de proteção ao crédito.

Ao negar o mandado de segurança impetrado pelo candidato, o tribunal local levou em consideração a Lei Distrital 3.669/2005, que criou a carreira de atividades penitenciárias, cujo artigo 4º, parágrafo único, IV, exige a "comprovação de idoneidade e conduta ilibada na vida pública e na vida privada".

Segundo a ministra Laurita Vaz, os inquéritos que embasaram a decisão do TJDFT deram origem a duas ações penais, que ainda estavam em andamento. Mesmo assim, por não terem gerado condenação definitiva, não poderiam impedir o candidato.

Em seu voto, a relatora destacou que fere o princípio da presunção de inocência e contraria a jurisprudência do STJ e do STF a reprovação de candidato, ainda na fase de investigação social, por ter sido verificada a existência de inquérito policial ou de ação penal não transitada em julgado.

Quanto ao cadastro de inadimplentes, a magistrada reconheceu que já houve decisão em sentido contrário no STJ, mas votou para que as anotações não pudessem interferir na avaliação do candidato. Para ela, "se nem as ações penais em curso podem alicerçar o ato de eliminação em concurso público na fase de investigação social, mostra-se desprovido de razoabilidade e proporcionalidade permitir-se que essa medida possa ser tomada com base no registro do nome do candidato em cadastro de serviço de proteção ao crédito".

Transação penal não significa maus antece​​​dentes

A Quinta Turma, acompanhando o relator, ministro Felix Fischer, no RMS 28.851, entendeu que a transação penal homologada por fatos imputados ao candidato a concurso não é, por si só, capaz de gerar sua exclusão na fase de investigação social.

No caso analisado pelo órgão julgador, um aspirante ao cargo de agente penitenciário afirmou que, apesar de ter obtido êxito em todas as fases da disputa, foi reprovado na investigação social e criminal em virtude de transação penal homologada anteriormente, relativa a suposto cometimento de crime de baixo potencial ofensivo.

Ao proferir seu voto, o relator destacou que, entre os diversos efeitos da transação penal em benefício do acusado, como reconhecido pela doutrina, está a não imputação de reincidência nem de registro de maus antecedentes.

"A transação penal a que alude o artigo 76 da Lei 9.099/1995 não importa em condenação do autor do fato", declarou o magistrado, para quem "revela-se ilegal o ato administrativo que tem o recorrente como não recomendado em virtude tão somente de haver celebrado transação penal".

Apesar disso, Fischer lembrou que há independência entre as instâncias criminal e administrativa, de modo que a transação penal obtida pelo acusado não poderia ter o efeito automático de impedir a apuração do mesmo fato na esfera administrativa, nem a aplicação das penalidades correspondentes.

Falta de documentação obrigatória não é t​​olerada

No julgamento do  AgInt no RMS 63.700, a Primeira Turma manteve decisão monocrática do ministro Sérgio Kukina que negou provimento a recurso de candidato que deixou de entregar documentação obrigatória na fase de investigação social, implicando sua contraindicação nesta fase.

O candidato alegou que, após questionar sua desclassificação, obteve resposta que o induziu em erro e o impediu de esclarecer que os documentos em questão já tinham sido entregues.

Em seu voto, concordando com a fundamentação do tribunal de origem, Sérgio Kukina entendeu não haver ilegalidade ou abuso de poder na conduta da banca examinadora, pois ficou comprovado que o candidato deixou de apresentar a certidão dos cartórios de execução cível das cidades onde residia e onde havia residido nos últimos cinco anos, como exigido pelo edital.

"Ilegalidade haveria se, em manifesta violação da norma de regência, fosse o impetrante declarado aprovado, ou a ele se oferecesse a vedada dilação temporal para a apresentação dos documentos pessoais destinados a subsidiar a avaliação de idoneidade e conduta ilibada", afirmou o magistrado.

O ministro considerou que não fazia sentido o argumento do candidato sobre indução em erro, pois os critérios e parâmetros para comprovação de idoneidade e conduta ilibada (investigação social) foram clara e previamente estipulados.

"A eliminação do candidato, executada em estrita conformidade com a prévia e expressa previsão editalícia, não caracteriza ilegalidade nem abuso de poder", disse o relator.

Drogas na juventude, questão de razoabili​​dade

Ao analisar o AREsp 1.806.617, a Segunda Turma determinou a reintegração de candidato eliminado na fase de investigação social de concurso da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) porque havia usado drogas oito anos antes.

Segundo os autos, o candidato, ocupante do cargo de professor na rede pública, ao preencher formulário para o concurso da PMDF em 2019, relatou que foi usuário de drogas quando tinha 19 anos de idade e que não mais tinha esse hábito. Por isso, foi considerado "não recomendado" para assumir o posto de policial.

Na primeira instância, o juízo acolheu o pedido de reintegração, mas o TJDFT reformou a sentença por entender que a admissão de policial com histórico de dependência química está subordinada à discricionariedade da administração pública, de forma que o Judiciário não poderia rever o ato questionado, salvo em caso de ilegalidade.

Postura contraditória da administraçã​​​o pública

No STJ, o relator, ministro Og Fernandes, destacou que a corte, ao examinar casos envolvendo a eliminação de candidatos na fase de investigação social para as carreiras policiais, entende que a sindicância de vida pregressa deve estar amparada nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

"Impedir que o recorrente prossiga no certame público para ingresso nas fileiras da PMDF, além de revelar uma postura contraditória da própria administração pública – que reputa como inidôneo um candidato que já é integrante dos quadros do serviço público distrital –, acaba por lhe aplicar uma sanção de caráter perpétuo, dado o grande lastro temporal entre o fato tido como desabonador e o momento da investigação social", declarou o magistrado.

Quanto à tese de que o Judiciário não poderia rever o ato, o relator ressaltou que a discricionariedade conferida ao administrador não é imune ao controle do Poder Judiciário, notadamente diante dos atos que restringem direitos dos administrados, como a eliminação de concurso público, cabendo à Justiça reapreciar os aspectos vinculados do ato administrativo (competência, finalidade e forma), além da razoabilidade e da proporcionalidade.​

Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/26092021-Razoabilidade--proporcionalidade--presuncao-de-inocencia-a-investigacao-social-em-concurso--na-visao-do-STJ.aspx>. Acesso em 27.09.2021 

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

RMS 60984RMS 47528RMS 30734RMS 28851AREsp 1806617RMS 63700

terça-feira, 3 de agosto de 2021

STJ - Dano a estação ecológica causado por construção pode ser absorvido pelo delito de edificação irregular

STJ - Dano a estação ecológica causado por construção pode ser absorvido pelo delito de edificação irregular

​​Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o delito de causar dano a unidade de conservação (artigo 40 da Lei 9.605/1998) pode ser absorvido pelo delito de construir em solo que, por seu valor ecológico, não é edificável (artigo 64 da Lei 9.605/1998).

Aplicando este entendimento, o colegiado negou recurso especial do Ministério Público Federal (MPF) contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que, pelo princípio da consunção, entendeu ser possível a absorção do crime-meio dano ambiental pelo crime-fim edificação proibida.

A controvérsia teve origem na construção de uma edícula de alvenaria de 261m² dentro da área da Estação Ecológica de Carijós, em Florianópolis, sem autorização da Administração Pública. O MPF ofereceu denúncia contra o construtor, pleiteando sua condenação com base nos artigos 40 e 48 da Lei de Crimes Ambientais.

Proteção de espaços com relevância ambiental

O relator do recurso, ministro Ribeiro Dantas, explicou que as unidades de conservação não são o único espaço a receber tutela especial da legislação penal, pois a Lei 9.605/1998 tipifica, também, os danos ambientais causados em outras espécies de áreas, como as florestas de preservação permanente, as de domínio público, a Mata Atlântica, a vegetação fixadora de dunas e mangues e as praias.

"Na verdade, considerando a quantidade e diversidade de espaços protegidos pela Lei 9.605/1998, é mesmo difícil imaginar uma situação em que o delito do artigo 64 (na ação típica de construir em área não edificável por seu valor ecológico) não produza, também, danos sobre algum dos outros espaços referidos naquele diploma legislativo", afirmou.

O ministro apontou a dificuldade em definir o alcance destes tipos incriminadores, por causa do "emaranhado de regimes jurídicos de proteção de espaços com relevância ambiental, os quais não receberam do legislador um tratamento sistemático".

Absorção de um crime por outro

Todavia, frisou o magistrado, para avaliar a possibilidade de absorção de um crime por outro, o mais importante é verificar se o delito menor se encontra na cadeia causal do delito continente, como uma etapa do iter criminis - seja na preparação, consumação ou exaurimento do crime maior.

"Este raciocínio, ao contrário do que defende o órgão acusador, não é obstado pela diversidade de bens jurídicos protegidos por cada tipo incriminador; tampouco impede a consunção o fato de que o crime absorvido tenha pena maior do que a do crime continente", explicou.

Segundo Ribeiro Dantas, a distinção entre os bens jurídicos tutelados pelos artigos 40 e 64 da Lei 9.605/1998 não é "tão intensa" como alega o MPF, já que o último dispositivo se refere, expressamente, à construção em espaços não edificáveis por sua especial relevância ecológica.

Construção em local não edificável

No caso julgado pelos ministros da Quinta Turma, Ribeiro Dantas ressaltou que o dano causado pela construção à estação ecológica se encontra, efetivamente, absorvido pela edificação irregular.

Para o magistrado, o dano pode, em tese, ser considerado concomitante à construção, enquanto ato integrante da fase de execução do que trata o artigo 64 da Lei 9.605/1998 (construção em solo não edificável). Dessa forma, se aplicaria o princípio da consunção em sua formulação genérica; ou, então, como consequência inafastável e necessária da construção, de maneira que seu tratamento jurídico seria o de pós-fato impunível.

"De todo modo, o dano à unidade de conservação se situa na escala causal da construção irregular (seja como ato executório ou como exaurimento), nela exaurindo toda sua potencialidade lesiva", concluiu o relator.

Leia o acórdão do REsp 1.925.717.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1925717

Disponível em:<https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/03082021-Dano-a-estacao-ecologica-causado-por-construcao-pode-ser-absorvido-pelo-delito-de-edificacao-irregular-.aspx>. Acessado em 03.08.2021


domingo, 6 de junho de 2021

STJ - Terceira Seção define critérios para progressão penal de condenados com reincidência genérica - RITO REPETITIVOS!

Terceira Seção define critérios para progressão penal de condenados com reincidência genérica

RECURSO REPETITIVO

04/06/2021 07:00

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Em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.084), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a aplicação retroativa do patamar estabelecido no artigo 112, V, da Lei de Execução Penal – LEP (Lei 7.210/1984), com a redação dada pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), aos condenados por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, que não sejam reincidentes em delito da mesma natureza.

O colegiado entendeu que, diante da ausência de previsão, no Pacote Anticrime, de parâmetros para a progressão de regime prisional dos condenados por crime hediondo ou equiparado que sejam reincidentes genéricos, deve ser considerado para eles o mesmo percentual de cumprimento de pena exigido dos sentenciados primários: 40%.

Como esse percentual é inferior ao estabelecido antes da vigência do Pacote Anticrime – portanto, mais benéfico para o réu –, os ministros entenderam também que a regra deve ser aplicada retroativamente aos condenados por crime hediondo, sejam primários ou reincidentes genéricos.

Lacuna legal

No mesmo julgamento, a Terceira Seção definiu que os condenados por crimes praticados com violência contra a pessoa ou grave ameaça, bem como por crimes hediondos ou equiparados com resultado morte, e que sejam reincidentes – mas não em crimes da mesma natureza –, têm direito à progressão de regime prisional a partir do cumprimento dos mesmos percentuais de pena exigidos daqueles que são primários.

Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, as três situações examinadas no julgamento "evidenciam a inexistência de previsão legal acerca de hipóteses que desafiam cotidianamente o trabalho desenvolvido pelas inúmeras varas de execução penal do país".

Ele explicou que o Pacote Anticrime promoveu profundas alterações nas normas da progressão de regime penal – entre elas, a revogação do artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/1990), segundo o qual os condenados por crime hediondo teriam direito ao benefício só após o cumprimento de dois quintos da pena, se fossem primários, ou de três quintos, no caso de reincidentes genéricos ou específicos.

Novos critérios

Com a mudança – afirmou o magistrado –, os parâmetros da progressão passaram a ser disciplinados exclusivamente pelo artigo 112 da LEP, que, na atual redação, estabelece condições diferentes conforme a natureza do delito (comum ou hediondo), a ocorrência ou não de violência, grave ameaça ou morte, e a primariedade, a reincidência genérica ou a reincidência específica do apenado.

Contudo, o relator ressaltou que a lei não estabeleceu quais seriam os patamares relativos aos reincidentes genéricos nas hipóteses de crime hediondo ou equiparado, de crime hediondo ou equiparado com resultado morte e, ainda, de crime não hediondo praticado com violência contra a pessoa ou grave ameaça.

Schietti observou que o inciso V do artigo 112 da LEP, por exemplo, fixa o patamar de 40% de cumprimento da pena para os condenados por crime hediondo e equiparado que sejam primários, ao passo que o inciso VII prevê que os reincidentes na prática de crime hediondo ou equiparado devem cumprir ao menos 60% da pena para ter direito à progressão – nada dizendo sobre a situação dos reincidentes genéricos.

Analogia

A partir do pressuposto segundo o qual não se admite no direito penal a analogia in malam partem (prejudicial ao réu), o ministro concluiu que devem ser aplicados aos reincidentes genéricos os patamares de progressão referentes aos sentenciados primários, pois, "ainda que não sejam primários, reincidentes específicos também não o são".

Dessa maneira, o colegiado estabeleceu que:

Ao sentenciado que cometeu crime com violência contra a pessoa ou grave ameaça, mas não é reincidente em delito da mesma natureza – portanto, primário ou reincidente genérico –, deve ser aplicado o patamar de 25% de cumprimento da pena, como prevê o inciso III do artigo 112 da LEP.

Do apenado que praticou crime hediondo ou equiparado, mas também não é reincidente em crime de igual natureza, deve ser exigido o cumprimento mínimo de 40% da pena, como estabelecido no inciso V do mesmo dispositivo legal.

Por fim, para o apenado que cometeu crime hediondo ou equiparado com resultado morte, mas, igualmente, é primário ou reincidente genérico, será observado o requisito do inciso VI, "a", do artigo 112 – ou seja, 50%.​

Leia o acórdão no REsp 1.910.240.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1910240REsp 1918338

Fonte: Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/04062021-Terceira-Secao-define-criterios-para-progressao-penal-de-condenados-com-reincidencia-generica.aspx>.



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