domingo, 11 de abril de 2021

STJ define alcance da isenção tributária para portadores de doenças graves

STJ define alcance da isenção tributária para portadores de doenças graves

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A legislação beneficia com a isenção do Imposto de Renda pessoas acometidas por doenças graves, as quais, geralmente, necessitam de tratamentos de saúde ou do uso de medicamentos especiais. A Lei 7.713/1988 estabelece em seu artigo 6º, inciso XIV, que estão dispensados do pagamento do tributo os proventos de aposentadoria ou reforma de indivíduos acometidos por uma série de moléstias.

Segundo o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, a isenção fiscal concedida aos portadores de doença grave tem por objetivo "abrandar o impacto da carga tributária sobre a renda necessária à sua subsistência e sobre os custos inerentes ao tratamento da doença, legitimando um 'padrão de vida' o mais digno possível diante do estado de enfermidade" (REsp 1.507.230). 

Desde a​ edição da Lei 7.713​, em 1988, o texto do dispositivo que concede a isenção passou por várias alterações, até chegar à versão atual, de 2004. Ao longo desse tempo, a aplicação do benefício fez surgirem muitas dúvidas sobre o seu alcance. A lista de doenças é taxativa, ou é possível estender a isenção a pessoas com outros males? O benefício fiscal deve ser limitado aos aposentados, ou seria justo que abarcasse também os trabalhadores ativos? Caso a pessoa obtenha a cura para a doença, ela volta a pagar o imposto?

Todas essas questões aportaram no Judiciário e foram solucionadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), inclusive por meio da sistemática dos recursos especiais repetitivos, modalidade de julgamento voltada para as demandas de massa.

Rol t​​​axativo

Para o STJ, o rol de doenças previstas na Lei 7.713/1988 é taxativo, ou seja, apenas as pessoas portadoras das doenças ali mencionadas expressamente poderão ser contempladas com o direito à isenção do IR.

Em 2010, a Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.116.620, fixou a tese de que o conteúdo normativo do artigo 6º, XIV, da Lei 7.713/1988, com as alterações promovidas pela Lei 11.052/2004, é explícito ao conceder o benefício fiscal da isenção de IR apenas em favor dos aposentados portadores das seguintes doenças: moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida.

Dessa forma, segundo o entendimento firmado pelo STJ em recurso especial repetitivo (Tema 250), não são isentos do IR os proventos recebidos por aposentados portadores de moléstias graves não elencadas na lei.

Citando precedente firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 233.652, o relator do caso julgado pelo STJ, ministro Luiz Fux (atualmente no STF), afirmou que o rol contido no dispositivo legal restringe a concessão de isenção às situações nele enumeradas.

"Revela-se interditada a interpretação das normas concessivas de isenção de forma analógica ou extensiva, restando consolidado entendimento no sentido de ser incabível interpretação extensiva do aludido benefício à situação que não se enquadre no texto expresso da lei, em conformidade com o estatuído pelo artigo 111, II, do Código Tributário Nacional", ressaltou o magistrado.

Só para ina​​​tivos

Dez anos após definir que é taxativo o rol de moléstias graves, a Primeira Seção voltou ao assunto para, também em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.037), fixar a tese de que a isenção do IR prevista na Lei 7.713/1988 para os proventos de aposentadoria e reforma não é aplicável no caso de trabalhador com doença grave que esteja na ativa.

Por maioria de votos, o colegiado firmou a tese com base em jurisprudência consolidada do STJ no sentido da impossibilidade de isenção do IR para as pessoas em atividade. Assim como no caso da lista de doenças, a Primeira Seção considerou que, nos termos do Código Tributário Nacional, a legislação que disciplina isenções deve ser interpretada de forma literal.

"Como reza o artigo 111, inciso II, do CTN, a legislação que disponha sobre isenção tributária deve ser interpretada literalmente, não cabendo ao intérprete estender os efeitos da norma isentiva, por mais que entenda ser uma solução que traga maior justiça do ponto de vista social. Esse é um papel que cabe ao Poder Legislativo, e não ao Poder Judiciário", declarou o relator, ministro Og Fernandes.

O magistrado afirmou que o inciso XIV do artigo 6º da Lei 7.713/1988 se refere, de forma literal, aos proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço "e" os recebidos pelos portadores de moléstia profissional ou das doenças relacionadas no dispositivo.

Segundo Og Fernandes, a existência da partícula "e" no texto legal fez com que alguns intérpretes adotassem o entendimento de que a isenção foi concedida para os aposentados e também para os portadores de doenças, estivessem eles em atividade ou não.

O relator esclareceu, porém, que a partícula "e" significa que estão isentos os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os proventos percebidos pelos portadores de moléstia profissional.

Outras pro​​​vas

Conforme a Súmula 598 do STJ, é desnecessária a apresentação de laudo médico oficial para o reconhecimento judicial do direito à isenção do IR, desde que o magistrado entenda suficientemente demonstrada a doença grave por outros meios de prova.

No julgamento de um dos precedentes que originou a súmula, o AgRg no AREsp 81.149, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho (recentemente aposentado) explicou que o laudo pericial do serviço médico oficial é, sem dúvida, uma importante prova e merece toda a confiança e credibilidade.

Porém, tal laudo, no entender do magistrado, "não tem o condão de vincular o juiz, que, diante das demais provas produzidas nos autos, poderá concluir pela comprovação da moléstia grave".

Segundo ele, entendimento contrário levaria à conclusão de que ao Judiciário não haveria outro caminho senão a chancela do laudo produzido pela perícia oficial, o que não se coaduna com os princípios do contraditório e da ampla defesa. 

Sem s​​intomas

Já a Súmula 627 do STJ preceitua que o contribuinte portador de alguma das doenças mencionadas na lista faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do IR, não sendo exigível que demonstre a contemporaneidade dos sintomas ou a recidiva.

No julgamento do AgInt no REsp 1.713.224, o relator, ministro Benedito Gonçalves, afirmou que a jurisprudência pacífica do STJ considera que, para fins de concessão do benefício fiscal, não é necessário demonstrar a contemporaneidade dos sintomas ou a validade do laudo pericial. "A Primeira Seção desta corte recentemente editou a Súmula 627, que pacificou, por derradeiro, o entendimento ora exposto", declarou.

Em junho de 2020, a Primeira Turma decidiu (REsp 1.836.364) que o sucesso no tratamento de uma doença grave não afasta o direito à isenção de IR previsto na legislação.

Para o colegiado, na hipótese de contribuintes acometidos por doenças classificadas como graves – nos termos do artigo 6º, inciso XIV, da Lei 7.713/1988 –, a isenção do IR não pode ser afastada pela falta de atualidade do quadro clínico que gerou o benefício, como estabelecido na Súmula 627 do STJ, segundo a qual a contemporaneidade dos sintomas não é requisito para o reconhecimento do direito.

Por unanimidade, o colegiado garantiu a isenção do IR a um aposentado que apresentou quadro de cardiopatia grave durante anos, mas obteve sucesso no tratamento da doença após cirurgia realizada em 2016.

"O referido benefício independe da presença, no momento de sua concessão ou fruição, dos sintomas da moléstia, pois é de conhecimento comum que determinados males de saúde exigem, da pessoa que os teve em algum momento de sua vida, a realização de gastos financeiros perenes – relacionados, por exemplo, a exames de controle ou à aquisição de medicamentos", afirmou o relator do recurso do contribuinte, ministro Napoleão Nunes Maia Filho.

Na ação, o aposentado pediu o reconhecimento em definitivo da isenção e a restituição dos valores pagos dentro do prazo prescricional de cinco anos. O ministro Napoleão destacou que, apesar do sucesso no tratamento da cardiopatia, as informações do processo indicam que a doença, além de impor gastos adicionais, tem natureza reincidente – ou, pelo menos, risco de reincidência.

Ter​​mo inicial

Para o STJ, o termo inicial da isenção e da restituição dos valores recolhidos a título de IR sobre proventos de aposentadoria de portadores de moléstias graves deve ser a data em que foi comprovada a doença, ou seja, a data do diagnóstico médico, e não a da emissão do laudo oficial.

O entendimento foi reafirmado pela Segunda Turma em 2018, no julgamento do AREsp 1.156.742. Segundo a relatora, ministra Assusete Magalhães, é desnecessária, conforme precedentes do STJ, a realização de outras inspeções médicas periódicas, como condição para manter a isenção do IR já reconhecida para os portadores das moléstias graves.

Em outro caso analisado também pela Segunda Turma, referente a pleito de isenção do IR formulado por portador de doença caracterizada como cardiopatia grave, o colegiado afirmou que o benefício independe da contemporaneidade dos sintomas, sendo dispensada a exigência de reavaliação pericial periódica.

"A jurisprudência desta casa compreende que essa situação se enquadra naquela que permite o gozo da isenção pretendida do Imposto de Renda, tendo em vista o seu objetivo de amenizar os gastos do paciente aposentado com a continuidade de seu tratamento, facilitando-a, ainda que se o considere clinicamente 'curado' ou com a doença sob controle", disse o relator, ministro Mauro Campbell Marques, no RMS 57.058.

Previdência privad​​a

De relatoria do ministro Humberto Martins, o REsp 1.507.320 definiu serem isentos do pagamento do IR os valores recebidos de fundo de previdência privada a título de complementação da aposentadoria por pessoa acometida de uma das doenças listadas na Lei 7.713/1988. 

A decisão se baseou no entendimento de que o capital acumulado em plano de previdência privada tem natureza previdenciária, pois representa patrimônio destinado à geração de aposentadoria – e inclusive porque a previdência privada é tratada na seção sobre previdência social da Constituição Federal. Para Humberto Martins, isso legitima a isenção sobre a parcela complementar recebida pelos portadores de moléstias graves.

"O caráter previdenciário da aposentadoria privada encontra respaldo no próprio Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 3.000/1999), que estabelece em seu artigo 39, parágrafo 6º, a isenção sobre os valores decorrentes da complementação de aposentadoria", afirmou o relator.​

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1116620REsp 1814919REsp 1836091AREsp 81149REsp 1713224REsp 1836364AREsp 1156742RMS 57.058REsp 1507320Fonte: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/11042021-STJ-define-alcance-da-isencao-tributaria-para-portadores-de-doencas-graves.aspx


terça-feira, 16 de março de 2021

STF - É constitucional lei estadual que obrigue os planos de saúde a fornecerem aos consumidores informações e documentos justificando as razões pelas quais houve recusa de algum procedimento, tratamento ou internação.


É constitucional lei estadual que obrigue os planos de saúde a fornecerem aos consumidores informações e documentos justificando as razões pelas quais houve recusa de algum procedimento, tratamento ou internação. O Mato Grosso do Sul editou uma lei estadual prevendo que, se o plano de saúde recusar algum procedimento, tratamento ou internação, ele deverá fornecer, por escrito, ao usuário, um comprovante fundamentado expondo as razões da negativa. O STF entendeu que essa norma não viola competência privativa da União, considerando que ela trata sobre proteção ao consumidor, matéria inserida na competência concorrente (art. 24, V, da CF/88). STF. Plenário. ADI 4512/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/2/2018 (Info 890).

domingo, 14 de março de 2021

STJ - Pandemia trouxe novos desafios ao Judiciário na análise da situação dos presos

Pandemia trouxe novos desafios ao Judiciário na análise da situação dos presos

ESPECIAL
14/03/2021 06:55

​​​Um ano após registrar a primeira vítima fatal do novo coronavírus, o Brasil contabiliza 277 mil mortes e 11,4 milhões de casos de pessoas infectadas. Em todo o mundo, segundo dados da universidade norte-americana Johns Hopkins, já houve 2,6 milhões de mortes e 119,5 milhões de casos de Covid-19.​


A partir da primeira morte reconhecida oficialmente no Brasil, em 12 de março de 2020, a pandemia impôs enormes desafios, não apenas à saúde pública e à economia, mas também ao Poder Judiciário. Além de terem que se adaptar às medidas de distanciamento social, os tribunais foram acionados para enfrentar uma série de questões inéditas relacionadas à crise sanitária.

Desde o princípio, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) precisou se manifestar sobre as implicações da pandemia no sistema prisional, buscando o equilíbrio entre a prevenção da doença, a proteção dos direitos fundamentais do preso e o interesse social tutelado na decisão que levou ao encarceramento – seja para cumprimento de pena, seja em caráter provisório ou até mesmo pela falta de quitação de pensão alimentícia.

Ainda antes da publicação de regras específicas que orientassem os magistrados diante da Covid-19, o tribunal já havia decidido com base na pandemia: em 17 de março de 2020, o ministro Rogerio Schietti Cruz substituiu a prisão preventiva de Astério Pereira dos Santos, ex-secretário de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro, por medidas cautelares diversas, devido ao risco de contágio no presídio.

Na decisão, o ministro explicou que, na atual crise sanitária, a aplicação da Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal (STF) deve ser flexibilizada, salvo situações de necessidade "inarredável" da prisão preventiva – em especial, no caso de crimes cometidos com grande violência ou de pessoas que representem perigo evidente para a sociedade, ou ainda diante de indícios consistentes de risco de fuga, destruição de provas ou ameaça a testemunhas.

No caso de Astério Pereira dos Santos, a acusação é por corrupção e lavagem de dinheiro, sendo ele um dos supostos organizadores da arrecadação de propinas pagas por empresários a agentes públicos. O ministro destacou que os crimes imputados não foram praticados com violência ou grave ameaça contra pessoas.

"Deve-se fortalecer sobremaneira o princípio da não culpabilidade e eleger, com primazia, medidas alternativas à prisão processual, com o propósito de não agravar ainda mais a precariedade do sistema penitenciário e evitar o alastramento da doença nas prisões", afirmou o magistrado.

Para ele, a prisão antes da condenação "é o último recurso a ser utilizado neste momento de adversidade, com notícia de suspensão de visitas e isolamento de internos, de forma a preservar a saúde de todos" (HC 565.799).
Reco​​mendação

No mesmo dia, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Recomendação 62/2020, estabelecendo uma série de regras a serem consideradas pelos juízes para a aplicação do direito penal no contexto da pandemia.

O texto sugere a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pela Covid-19 no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo. Segundo o CNJ, as recomendações têm como finalidades a proteção da vida e da saúde das pessoas, a redução dos fatores de propagação do vírus e a garantia da continuidade da prestação jurisdicional.

Entre outros pontos, o normativo recomenda a reavaliação da prisão preventiva, que deve ser vista como medida de máxima excepcionalidade, com atenção para os protocolos das autoridades sanitárias. O conteúdo foi atualizado em outras duas recomendações do CNJ (68 e 78), em junho e setembro.

Imediatamente após a publicação da primeira recomendação, advogados de todo o país começaram a invocá-la em pedidos de habeas corpus, muitos dos quais chegaram ao STJ.

No dia 19 de março, a ministra Nancy Andrighi determinou que um devedor de pensão alimentícia deixasse a prisão civil em regime fechado, passando para a prisão domiciliar. Segundo a ministra, a Recomendação 62/2020 autorizou a substituição da prisão fechada do devedor de alimentos pelo regime domiciliar, para evitar a propagação da doença.

"Diante desse cenário, é preciso dar imediato cumprimento à recomendação do CNJ, como medida de contenção da pandemia causada pelo coronavírus", afirmou a magistrada (processo em segredo de Justiça).
Medida nac​ional

Na semana seguinte, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino deferiu um pedido da Defensoria Pública do Ceará e determinou que os presos por dívidas alimentícias daquele estado passassem para o regime domiciliar.

Segundo a DP, apesar das orientações do CNJ, a Justiça estadual ainda não havia transferido para o regime domiciliar os presos por dívida de pensão alimentícia, o que justificaria a atuação do STJ no caso. Para Sanseverino, a recomendação é clara ao estimular a adoção de medidas de proteção à saúde.

Uma das preocupações que levaram à edição do normativo, de acordo com o magistrado, é que a aglomeração de pessoas em unidades prisionais insalubres poderia dificultar os procedimentos mínimos de higiene e o isolamento rápido dos indivíduos com sintomas da Covid-19.

"Portanto, considerando o crescimento exponencial da pandemia em nosso país e no mundo, e com vistas a assegurar efetividade às recomendações do CNJ para conter a propagação da doença, concedo parcialmente a liminar para determinar o cumprimento das prisões civis por devedores de alimentos do estado do Ceará, excepcionalmente, em regime domiciliar", concluiu (processo em segredo de Justiça).

Um dia depois, o ministro Sanseverino estendeu os efeitos da liminar aos presos por dívidas alimentícias de todo o país. As condições de cumprimento da prisão domiciliar seriam estipuladas pelos juízes estaduais – inclusive quanto à duração –, levando em conta as medidas adotadas para a contenção da pandemia.

A Lei 14.010/2020, sancionada em junho, criou o Regime Jurídico Emergencial e Transitório (RJET) das relações jurídicas de direito privado no período da pandemia e estabeleceu, em seu artigo 15, que a prisão civil por dívida alimentar deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar – tal como determinado pelo ministro Sanseverino.
Grupo​​​ de risco

Um dos critérios da Recomendação 62/2020 para a adoção de regime menos gravoso que o fechado é a classificação do preso no grupo de risco da Covid.

Com base nessa orientação, em 27 de abril, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca determinou que um empresário cumprisse prisão no regime domiciliar, em razão da sua condição de saúde debilitada.

"A declaração pública da situação de pandemia pelo novo coronavírus – Covid-19 –, no dia 30 de janeiro de 2020, pela Organização Mundial de Saúde (OMS), requer a adoção de medidas preventivas de saúde pública para evitar a propagação do vírus", justificou (HC 563.142).

Entendimento semelhante levou o magistrado a substituir a prisão preventiva de um idoso de 79 anos, integrante do grupo de risco, por medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).

Reynaldo Soares da Fonseca destacou a necessidade de reavaliação das prisões provisórias das pessoas em grupo de risco. No caso sob análise, ele disse haver informações de que o preso estava com a saúde debilitada, tendo, inclusive, passado mais de um mês de sua prisão preventiva internado em manicômio judiciário (RHC 122.966).
Exigência​​ de fiança

Em 27 de março, o ministro Sebastião Reis Júnior atendeu um pedido da Defensoria Pública e determinou a soltura de todos os presos do Espírito Santo cuja liberdade provisória estivesse condicionada ao pagamento de fiança e ainda se encontrassem na prisão.

Segundo o magistrado, na crise da pandemia, condicionar a liberdade ao pagamento de fiança é medida "irrazoável".

A DP apontou que a superlotação dos presídios no Espírito Santo era "campo fértil" para a propagação do vírus, devendo ser aplicada a recomendação do CNJ que preconiza a máxima excepcionalidade das ordens de prisão preventiva.


No caso das seis pessoas cuja prisão em flagrante motivou a impetração do habeas corpus, o juiz entendeu pela ausência dos requisitos que autorizariam a conversão em preventiva, optando por aplicar medidas cautelares diversas e exigindo a fiança.

"Diante do que preconiza o CNJ em sua resolução, não se mostra proporcional a manutenção dos investigados na prisão, tão somente em razão do não pagamento da fiança, visto que os casos – notoriamente de menor gravidade – não revelam a excepcionalidade imprescindível para o decreto preventivo", afirmou o ministro, acrescentando que o Judiciário não pode ficar alheio aos problemas econômicos decorrentes da pandemia (HC 568.693).

Em 1º de abril, Sebastião Reis Júnior estendeu essa medida para todos os presos do país cuja liberdade estivesse condicionada a fiança.
Liberd​​ade genérica

Também em abril, o ministro Nefi Cordeiro indeferiu o pedido da Defensoria Pública do Distrito Federal para colocar em prisão domiciliar todos os presos incluídos no grupo de risco do coronavírus – entre eles, idosos e pessoas com certas doenças.

Ele mencionou que, segundo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), não havia omissão das autoridades locais que justificasse a concessão do regime domiciliar de forma indiscriminada.

O habeas corpus foi impetrado no STJ após o TJDFT negar liminar para a mesma finalidade. A Defensoria argumentou que as autoridades não teriam efetivado as medidas necessárias para conter a pandemia no cárcere – objeto da Recomendação 62/2020 do CNJ.

Nefi Cordeiro observou que a reavaliação da privação de liberdade daqueles que se encontram em cumprimento de pena ou prisão processual não pode prescindir da necessária individualização, "sendo indevida a consideração generalizada, avessa às particularidades da execução penal" (HC 570.634).

No mesmo sentido, o ministro Rogerio Schietti Cruz indeferiu um habeas corpus coletivo no qual a Defensoria Pública do Amazonas pedia a concessão de prisão domiciliar para todos os presos do regime fechado do Complexo Penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, que fossem integrantes do grupo de risco.

"O temor demonstrado pela impetrante é louvável, mas deve ser analisado em cotejo com a missão do direito penal", declarou o ministro, acentuando o risco da liberação de presos perigosos e a necessidade de uma avaliação individualizada dos pedidos.


Segundo Schietti, o surgimento da pandemia não pode ser utilizado como "passe livre" para impor ao juiz das execuções a soltura geral de todos os encarcerados, sem o conhecimento da realidade de cada situação específica (HC 572.292).
Ind​​ividualização

Durante as férias forenses de julho, o então presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, indeferiu um pedido da Defensoria Pública para flexibilizar as condições de prisão de todos os detentos em caráter provisório que se enquadrassem no grupo de risco.

Na decisão, Noronha ressaltou que, apesar das orientações do CNJ, é necessária a demonstração individualizada e concreta de que o preso preenche os seguintes requisitos: inequívoco enquadramento no grupo de vulneráveis da Covid-19; impossibilidade de receber tratamento no presídio; e exposição a mais risco de contaminação no estabelecimento prisional do que no ambiente social.

No pedido de habeas corpus coletivo, os autores alegaram que a situação nas penitenciárias brasileiras era de calamidade e que haveria risco de proliferação desenfreada do coronavírus entre a população carcerária. Para eles, apesar dessa situação, não havia uma ação incisiva do poder público para proteger a saúde e a vida dos presos pertencentes ao grupo de risco.

Segundo o então presidente, em relação à aplicação da Recomendação 62/2020, o STJ firmou entendimento no sentido de que a flexibilização da prisão provisória não ocorre de forma automática, sendo necessário identificar a situação concreta do preso e a do estabelecimento em que ele está recolhido (HC 596.189).
Pro​gressão

Ao analisar mais uma impetração de habeas corpus coletivo, em 24 de abril, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca indeferiu o pedido da Defensoria Pública de Santa Catarina para que fosse antecipada a concessão do regime aberto a todos os presos de Florianópolis que cumprissem pena no semiaberto e estivessem para atingir o prazo de progressão nos seis meses seguintes.

O ministro destacou que as orientações do CNJ não implicam a concessão generalizada de habeas corpus, pois é necessário analisar cada caso individualmente. A Recomendação 62 – explicou – aconselha a concessão de saída antecipada do semiaberto para gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até 12 anos ou por pessoa com deficiência, idosos, indígenas, pessoas com deficiência, presos do grupo de risco e os que estejam em presídios com ocupação superior à capacidade.

Em momento posterior, ao analisar o mérito do pedido, o magistrado reiterou que o pleito não poderia ser atendido de forma genérica.

Para Reynaldo Soares da Fonseca, as situações descritas pela DP não foram comprovadas – nem mesmo a alegação de que os pacientes se encontravam em ambiente superlotado. "A defesa formulou o pedido apenas de forma genérica, baseando-se em uma realidade geral brasileira, que infelizmente também não pode ser resolvida de uma forma geral", explicou.

Segundo ele, se até mesmo o juiz de primeira instância, mais perto dos fatos, não conseguiu julgar o pedido de forma genérica, devido à realidade diversa de cada preso, menos ainda poderia fazê-lo o STJ na análise de habeas corpus, "o qual exige celeridade, sem aprofundamento de questões fático-probatórias" (HC 574.978).
Outras h​​ipóteses

As diretrizes da Recomendação 62 do CNJ também podem ser aplicadas a pessoas fora do grupo de risco. Em abril, o ministro Sebastião Reis Júnior deferiu liminar para conceder prisão domiciliar a uma mulher sentenciada com 23 anos de idade e sem doenças crônicas.

Para o relator, embora ela estivesse fora do grupo de risco da doença, sua situação se enquadrava nas disposições da recomendação.

No habeas corpus, a defesa apontou constrangimento ilegal na decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que negou a liminar. Segundo a defesa, a jovem – condenada a cinco anos e dez meses por tráfico de drogas, no regime inicial semiaberto – é mãe de criança menor de 12 anos e não cometeu crime com violência ou grave ameaça, mas nem assim o juiz da execução autorizou a prisão domiciliar.

Sebastião Reis Júnior destacou que a recomendação indica aos magistrados a concessão de saída antecipada às mães e mulheres responsáveis por crianças de até 12 anos, e também recomenda a concessão de prisão domiciliar a todas as pessoas em cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto, mediante condições a serem definidas pelo juiz da execução (HC 570.608).
Des​​cumprimento

Em dezembro, o presidente do STJ, ministro Humberto Martins, determinou que o juízo da Vara de Execuções Criminais de Rosário do Sul (RS) cumprisse imediatamente decisão do ministro Antonio Saldanha Palheiro que concedeu prisão domiciliar humanitária, em virtude da Covid-19, a um homem com Aids e tuberculose condenado por tráfico de drogas. A decisão foi proferida em uma reclamação.

Em março, seguindo as diretrizes da Recomendação 62/2020, o relator concedeu a prisão domiciliar até o julgamento definitivo do habeas corpus. Apesar da decisão do STJ, o juízo da execução determinou o retorno do réu ao cárcere, afirmando que a prisão domiciliar foi concedida em um processo, mas que ele se encontrava no cumprimento de pena por força de outro processo.

O juízo concluiu que o preso não deveria ter sido colocado em regime domiciliar, por haver pena ativa e com saldo restante pendente de cumprimento.

O presidente do STJ enfatizou que a concessão da prisão domiciliar não ficou restrita a essa ou aquela execução, mas foi concedida por questões humanitárias, nos termos recomendados pelo CNJ e tão somente enquanto perdurar a pandemia.

A decisão que autorizou o regime domiciliar – acrescentou Humberto Martins – levou em conta a condição de saúde do preso e o eventual risco de contrair também a Covid-19, e não a existência de uma ou mais execuções penais em andamento, sendo, portanto, aplicável a todo e qualquer processo em que estivesse envolvido (Rcl 41.284).

Na próxima semana, publicaremos um compilado com algumas das decisões do tribunal sobre questões da pandemia em outros campos do direito, focando nos questionamentos a respeito do isolamento social.
Bibliografias Selecio​nadas

A série Bibliografias Selecionadas, produzida pela Biblioteca Ministro Oscar Saraiva, lançou uma edição especialmente dedicada ao tema Covid-19.

A publicação reúne referências de livros, artigos de periódicos, legislação, notícias de portais especializados e outros textos, muitos deles na íntegra. Periodicamente, são lançadas novas edições sobre temas relevantes para o STJ e para a sociedade em geral.

Acesse as demais edições de Bibliografias Selecionadas.​


Disponível em:<https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/14032021-Pandemia-trouxe-novos-desafios-ao-Judiciario-na-analise-da-situacao-dos-presos.aspx>. Acesso em 14.03.2021.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

STJ - Decisão do presidente do STJ e do CJF facilita resgate de precatórios e RPVs por advogados

 CJF

08/02/2021 20:09

Decisão do presidente do STJ e do CJF facilita resgate de precatórios e RPVs por advogados

A norma prevista no parágrafo 5º do artigo 40 da Resolução CJF 458/2017 não se aplica aos advogados que já tenham poderes decorrentes da cláusula ad judicia et extra, desde que dela constem poderes para dar e receber quitação, e, ainda, que seja acompanhada de certidão emitida pela secretaria da vara/juizado em que tramita o processo, atestando a habilitação do advogado para representar o titular do crédito a ser liberado.

A decisão foi tomada nesta segunda-feira (8), pelo presidente do Conselho da Justiça Federal (CJF), ministro Humberto Martins, ao analisar pedido de providências apresentado pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Sergipe em relação à determinação dos magistrados das 5ª e 8ª Varas Federais da Seção Judiciária daquele estado.

Controvér​​​sia

O pedido de providências foi interposto em razão da exigência, por parte dos magistrados, de apresentação de nova procuração, atualizada e com firma reconhecida, com a finalidade específica para o levantamento dos valores relativos a precatórios e requisições de pequeno valor (RPVs).

No procedimento, a OAB alegou que a exigência, além de ter sido feita sem a edição de ato administrativo formal, contraria atos da presidência do Tribunal Regional Federal da 5ª Região que regulamentam o pagamento de precatórios e RPVs e preveem a necessidade de simples autenticação, pela secretaria judiciária, da procuração que consta dos autos.  

Foram notificados o diretor do foro e os magistrados da 5ª e da 8ª Varas Federais da Seção Judiciária de Sergipe. Os juízes manifestaram-se no sentido de que precatórios e RPVs são sempre expedidos em nome do titular do crédito e que, além disso, o saque pode ser realizado pessoalmente pelo titular do crédito direto, na instituição bancária, ou por procurador habilitado nos autos, desde que cumpridas as determinações das instituições financeiras  – os bancos exigem do advogado procuração específica, nos termos do artigo 13, parágrafo 7º, da Lei 12.153/2009 e do artigo 40, parágrafo 5º, da Resolução 458/2017.    

Decis​​ão

O ministro Humberto Martins registrou que, em 1º de janeiro de 2021, entrou em vigor a Resolução CJF 670/2020, que alterou, incluiu e revogou dispositivos da Resolução 458/2017.

Entre as principais alterações, está a instituição das preferências no pagamento da parcela superpreferencial e a regulamentação do saque de valores por meio de procuradores do beneficiário, que passará a exigir a apresentação de procuração específica da qual conste o número da conta dos depósitos ou o número de registro da requisição de pagamento no tribunal.

O presidente do CJF destacou que a decisão está em harmonia com a Resolução CNJ 303/2019, que dispõe sobre a gestão dos precatórios e os respectivos procedimentos operacionais no âmbito do Poder Judiciário.

"Decidindo de outra forma, o Poder Judiciário inviabilizaria o livre exercício da advocacia consagrado em sede constitucional, sobretudo se, na relação convencionada entre a parte e o advogado, poderes especiais foram confiados a este para levantamento de valores devidos à parte beneficiária", observou o ministro.

"Nesse sentido, reafirmo que o parágrafo 5° do artigo 40 da Resolução CJF 458/2017 não se aplica aos advogados que já tenham poderes especiais decorrentes da cláusula ad judicia et extra, com os poderes especiais de receber e dar quitação, acompanhada de certidão emitida pela secretaria da vara ou juizado em que tramita o processo", esclarece a decisão.

"Ante o exposto, conheço do pedido e determino às varas federais da Seção Judiciária de Sergipe que se abstenham de exigir dos advogados com procuração ad judicia et extra, contendo poderes especiais de receber e dar quitação, a apresentação de uma nova procuração específica de levantamento de valores", concluiu Humberto Martins.

Precatório é uma requisição de pagamento expedida pela Justiça para determinar que um órgão ou uma entidade pública pague determinada dívida, resultante de uma ação judicial para qual não cabe mais recurso (trânsito em julgado). Nessa mesma definição, enquadra-se a requisição de pequeno valor (RPV). Para saber mais sobre precatórios, acesse a cartilha eletrônica aqui.

Com informações da Comunicação do CJF

Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/08022021-Decisao-do-presidente-do-STJ-e-do-CJF-facilita-resgate-de-precatorios-e-RPVs-por-advogados.aspx>. Acesso em 09.02.2021

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Atenção! Com modulação de efeitos, STJ admite agravo contra toda decisão interlocutória em recuperação ou falência

       STJ. RECURSO REPETITIVO. NOTICIA DE 03/02/2021 07:05*

Com modulação de efeitos, STJ admite gravo contra toda decisão interlocutória em recuperação ou falência

Em julgamento de recursos especiais repetitivos (Tema 1.022), a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é cabível agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias proferidas nos processos de recuperação judicial ou de falência, por força do artigo 1.015, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

Entretanto, o colegiado decidiu modular os efeitos da tese, que deve ser aplicada às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do acórdão que fixou o precedente qualificado e a todos os agravos interpostos antes da fixação da tese e que ainda se encontrem pendentes de julgamento na data da publicação do acórdão, excluindo-se apenas os agravos que não foram conhecidos pelos tribunais por decisão transitada em julgado.

Relatora dos recursos especiais, a ministra Nancy Andrighi explicou que, no regime recursal adotado pelo CPC, existem dois modelos diferentes de recorribilidade das decisões interlocutórias. Para as decisões na fase de conhecimento, será possível o agravo nas hipóteses listadas no artigo 1.015, observada a mitigação da taxatividade desse rol, conforme o Tema 988, julgado pela Corte Especial.

Já para as decisões nas fases de liquidação e cumprimento da sentença, no processo executivo e na ação de inventário, é cabível o agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias, de acordo com o artigo 1.015, parágrafo único, do CPC.

Mudança no sist​ema

Segundo a relatora, embora a Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei 11.101/2005) preveja o cabimento do agravo de instrumento em hipóteses específicas, deve ser levado em consideração que, no momento de sua publicação, vigorava do Brasil o CPC de 1973, que previa sistema recursal – em relação às decisões interlocutórias – diametralmente oposto ao regime instituído pelo CPC de 2015.

"Dessa forma, tendo sido modificado profundamente o regime recursal pelo CPC/2015, é preciso também ressignificar as hipóteses de cabimento previstas de modo esparso na Lei 11.101/2005, adequando-as ao modelo de recorribilidade das decisões interlocutórias instituído pela nova lei processual, especialmente sob a perspectiva da natureza jurídica dos processos recuperacionais e falimentares", apontou a ministra.

Liquidação e exec​ução

Em seu voto, Nancy Andrighi explicou que o processo recuperacional possui natureza jurídica de liquidação e de execução negocial das dívidas da pessoa jurídica, enquanto o processo falimentar tem natureza de liquidação e de execução coletiva das dívidas.

Por essa razão, a relatora entendeu que a melhor interpretação ao artigo 1.015, parágrafo único, do CPC/2015, é de que a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias na fase de liquidação e no processo de execução "contemplam também processos que, conquanto disciplinados por legislação extravagante, igualmente possuam natureza jurídica de liquidação e execução, como é o caso, por exemplo, dos processos recuperacionais e dos processos falimentares previstos na Lei 11.101/2005".

Ao propor a modulação de efeitos, Nancy Andrighi também ponderou que, para proteger quem confiou na impossibilidade de recorrer fora das hipóteses previstas pela Lei 11.101/2005 e por isso não interpôs agravo de instrumento, as decisões que não foram objeto de agravo poderão ser impugnadas em apelação ou em contrarrazões, nos termos do artigo 1.009, parágrafo 1º, do CPC/2015, se o interessado entender que ainda será útil o enfrentamento da questão em outro momento processual.​

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1707066REsp 1717213*Disponível em: <https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/03022021-Com-modulacao-de-efeitos--STJ-admite-agravo-contra-toda-decisao-interlocutoria-em-recuperacao-ou-falencia.aspx>. Acesso em 03.02.2021


sexta-feira, 7 de agosto de 2020

STF reconhece tempo de cursos de pós-graduação como atividade jurídica

 STF reconhece tempo de cursos de pós-graduação como atividade jurídica

Para a maioria dos ministros, a contagem desse tempo não quebra o princípio da isonomia nos concursos públicos.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou constitucional a contagem do tempo dos cursos de pós-graduação para comprovação de atividade jurídica em concursos para a magistratura e o Ministério Público. Na sessão virtual encerrada em 4/8, o Plenário, por maioria de votos, julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4219, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A OAB questionava a validade do artigo 3º da Resolução 11/2006 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o parágrafo único do artigo 1º da Resolução 29/2008 do Conselho Nacional do MP (CNMP). Em relação à resolução do CNJ, o Plenário julgou a ação prejudicada, pois a norma foi revogada por outra. A decisão foi unânime, nos termos do voto da relatora, ministra Cármen Lúcia.

Quanto à resolução do CNMP, prevaleceu o voto divergente do ministro Edson Fachin, que considerou válida a contagem do tempo dos cursos de pós-graduação para efeitos de cumprimento da exigência de três anos de prática de atividade jurídica. O prazo está previsto nos artigos 93, inciso I, e 129, parágrafo 3º, da Constituição Federal, instituído pela Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional 45/2004).

Indissociáveis

Para o ministro Fachin, teoria e prática do saber estão interligados e devem ser conduzidos de forma indissociada, "sem que exista, entre eles, uma relação de hierarquia para os fins buscados pela norma". Assim, um candidato a concurso que tenha concluído sua pós-graduação com sucesso "terá adquirido um conhecimento que extrapola os limites curriculares da graduação em Direito".

Segundo Edson Fachin, a teoria está necessariamente ligada a um conjunto de práticas que se combinam. "Superou-se a imagem de uma prática desprovida de pré-compreensões e de pressupostos: toda prática herda um conjunto de saberes teóricos que a tornam inteligível", afirmou.

No seu entendimento, não há, no caso, comprometimento do princípio da isonomia nos concursos públicos. "A obtenção dos títulos decorrente da formação continuada tende, em verdade, a privilegiar uma visão mais ampla da formação dos integrantes das variadas carreiras jurídicas", disse Fachin. “Essa visão promove o alargamento das competências classicamente associadas a essas profissões".

Vencidos

Ficaram parcialmente vencidos a relatora, ministra Cármen Lúcia, o ministro Ricardo Lewandowski e a ministra Rosa Weber, que julgavam procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos da resolução do CNMP. Também ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Gilmar Mendes, que julgavam improcedente o pedido.

Para a relatora, a consideração dos cursos como atividade jurídica resulta em vantagem para os candidatos que cumpriram o triênio estipulado com a Emenda Constitucional 45/2004 apenas na conclusão dos estudos. "Outros candidatos, dedicados, por exemplo, à advocacia, ingressarão no concurso com pontuação menor e, portanto, com chance reduzida de nomeação", ponderou.
A ministra considera, assim, que a norma fere os princípios constitucionais da isonomia e da razoabilidade, pressupostos básicos do concurso público.

AR/CR//CF

Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=449106&ori=1>. Acesso em 07.08.2020.

terça-feira, 21 de julho de 2020

Empresa pagará salários a empregado considerado inapto após alta previdenciária - LIMBO JURÍDICO

Empresa pagará salários a empregado considerado inapto após alta previdenciária
TST - Não foi comprovada a recusa do empregado de voltar ao trabalho.
21/07/20 - A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Geraldo Unimar Transportes Ltda., de Vitória (ES), contra decisão que a condenou ao pagamento dos salários de um motorista que, após receber alta da Previdência Social, foi considerado inapto para retornar a suas funções e não foi reintegrado. Segundo a Turma, a decisão está de acordo com a jurisprudência do TST sobre a matéria.

Inaptidão

O motorista narrou, na reclamação trabalhista, que ficara afastado por auxílio previdenciário por cerca de cinco anos, em razão de problemas de saúde. Após receber alta do INSS e se apresentar para trabalhar, a empresa impediu seu retorno, com a alegação de que o exame médico realizado teria atestado sua inaptidão para o trabalho. Ainda de acordo com seu relato, após várias tentativas de voltar a trabalhar, foi dispensado. Ele pedia o reconhecimento da rescisão indireta do contrato (por falta grave da empregadora) e o pagamento dos salários desde a alta previdenciária até seu afastamento, além de indenização por dano moral.
A empresa, em sua defesa, sustentou que não era responsável pela situação em que se encontrava o trabalhador. Afirmou que, após a alta, ofereceu a função de porteiro, mas ele teria alegado que, por ainda estar em tratamento e em uso de medicação controlada, estaria incapacitado para exercer qualquer função. 

Comprovação

O Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) condenou a empresa ao pagamento dos salários referentes ao período de afastamento até a data da rescisão indireta do contrato de trabalho e fixou a reparação por danos morais em R$ 3 mil. Segundo o TRT, a transportadora não havia comprovado a sua versão sobre a recusa do motorista de voltar ao trabalho. Com isso, presumiu que teria negado o retorno e incorrido em falta grave, devendo ser reconhecida, portanto, a rescisão indireta. 

Limbo

O relator do recurso de revista da empresa, ministro Walmir Oliveira da Costa, destacou que, de acordo com a jurisprudência do TST, é do empregador a responsabilidade pelo pagamento dos salários do empregado a partir da alta previdenciária, ainda que ele seja considerado inapto pela junta médica da empresa, pois, com a cessação do benefício previdenciário, o contrato de trabalho voltou a gerar os seus efeitos. Assim, o TRT, ao concluir que a empresa não poderia ter deixado o empregado em um “limbo jurídico-trabalhista-previdenciário”, decidiu em consonância com o entendimento do TST.
A decisão foi unânime.
 
(DA/CF)

O TST possui oito Turmas, cada uma composta de três ministros, com a atribuição de analisar recursos de revista, agravos, agravos de instrumento, agravos regimentais e recursos ordinários em ação cautelar. Das decisões das Turmas, a parte ainda pode, em alguns casos, recorrer à Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1).
Esta matéria tem cunho meramente informativo.
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sábado, 27 de junho de 2020

STJ - Contagem de tempo de trabalho infantil para efeito previdenciário não deve ter idade mínima, afirma Primeira Turma

Contagem de tempo de trabalho infantil para efeito previdenciário não deve ter idade mínima, afirma Primeira Turma - STJ


​​Embora a legislação brasileira proíba o trabalho infantil, desconsiderar a atividade profissional exercida antes dos 12 anos resultaria em punição dupla ao trabalhador – que teve a infância sacrificada pelo trabalho e, no momento da aposentadoria, não poderia aproveitar esse tempo no cálculo do benefício.

O entendimento foi reafirmado pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) que, apesar de reconhecer que um segurado exerceu trabalho rural na infância, entendeu que só seria possível admitir esse tempo de atividade para efeitos de aposentadoria a partir dos 14 anos. O TRF3 levou em consideração que as Constituições de 1946 e 1967 – vigentes à época dos fatos, ocorridos entre as décadas de 1960 e 1970 – já proibiam o trabalho infantil.

"Reafirma-se que o trabalho da criança e do adolescente deve ser reprimido com energia inflexível, não se admitindo exceção que o justifique; no entanto, uma vez prestado o labor, o respectivo tempo deve ser computado, sendo esse cômputo o mínimo que se pode fazer para mitigar o prejuízo sofrido pelo infante, mas isso sem exonerar o empregador das punições legais a que se expõe quem emprega ou explora o trabalho de menores", afirmou o relator do recurso especial, ministro Napoleão Nunes Maia Filho.

Sem idade mín​​​ima

Em seu voto, o ministro Napoleão destacou jurisprudência o STJ no sentido de que a proibição legal do trabalho infantil tem o objetivo de proteger as crianças, constituindo benefício aos menores, e não prejuízo para aqueles que foram obrigados a trabalhar durante a infância.

O relator também lembrou que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), ao julgar ação civil pública sobre o tema, concluiu ser possível o cômputo do período de trabalho realizado antes dos 12 anos. Na hipótese julgada pelo TRF4 – explicou o ministro –, não foi adotado um requisito etário, tendo em vista que a fixação de uma idade mínima poderia prejudicar indevidamente o trabalhador.

"A rigor, não há que se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos, e não em um limite mínimo de idade abstratamente preestabelecido", apontou o ministro.

Chaga soc​​​​ial

Segundo Napoleão Nunes Maia Filho, não se pode entender como chancela ao trabalho infantil a decisão judicial que reconhece os efeitos previdenciários do exercício laboral "oriundo desta odiosa prática que ainda persiste como chaga na nossa sociedade", pois o que fundamenta esse reconhecimento é exatamente o compromisso de proteção às crianças e aos adolescentes.

Ao votar pelo provimento do recurso do segurado, o relator afirmou que o tempo de trabalho rural deve ser reconhecido sem limitação de idade mínima, "a fim de conferir a máxima proteção às crianças, atendendo ao viés protetivo das normas previdenciárias".

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

AREsp 956558

Disponível em: <http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Contagem-de-tempo-de-trabalho-infantil-para-efeito-previdenciario-nao-deve-ter-idade-minima--afirma-Primeira-Turma.aspx>

terça-feira, 9 de junho de 2020

TST - Mantida condenação de destilaria que descumpriu cota de aprendizagem

Mantida condenação de destilaria que descumpriu cota de aprendizagem

A empresa pagará R$ 300 mil por dano moral coletivo.
8/6/2020 - A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Destilaria de Álcool Libra Ltda., de São José do Rio Claro (MT), contra a condenação ao pagamento de R$ 300 mil por ter descumprido a exigência legal de empregar aprendizes em 5% do total de postos de trabalho. Por maioria, o colegiado entendeu que ficou caracterizado o dano moral coletivo.
Caso
O caso teve início em ação civil pública promovida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em junho de 2011, para que a empresa cumprisse a cota de aprendizes, conforme determina o artigo 429 da CLT. Segundo apurado pelo MPT, no momento da fiscalização pelo extinto Ministério do Trabalho, a Libra não tinha nenhum aprendiz. Com total de 1.300 empregados, a empresa deveria, de acordo com o Ministério Público, contratar 65 aprendizes no mínimo. 
Defesa
Na época, a empresa declarou que o auto de infração lavrado tomou por base a totalidade de 1.300 trabalhadores, “sem excluir, entretanto, as funções que não demandam formação profissional na fixação da base de cálculo”. Na versão da Libra, em vez dos 65 aprendizes, seriam necessários 33 para cumprir a legislação. 
Conduta antijurídica
Em novembro de 2012, o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) decidiu que não houve dano moral coletivo, mas a Terceira Turma do TST reformou a decisão e condenou a destilaria, em fevereiro de 2018, ao pagamento de indenização de R$ 300 mil, ao julgar recurso do MPT. A Turma considerou antijurídica a conduta da Libra ao deixar de observar a legislação trabalhista relativa à contratação de aprendizes.
Presunção de lesão
Nos embargos à SDI-1, a Libra contestou a condenação e classificou como “exorbitante” o valor fixado para a indenização. Para reforçar o pedido de diminuição do valor, anexou comprovante de que estava em recuperação judicial. Argumentou, ainda, que o dano moral coletivo pressupõe a prática de ilícito causador de repulsa social e que seria preciso demonstrar a relação entre a sua conduta e a lesão à coletividade. Para a empresa, a condenação ocorreu com base em presunção de lesão. 
Função social
O relator dos embargos, ministro Vieira de Mello Filho, enfatizou que não é necessário comprovar a repercussão de eventual violação na consciência coletiva do grupo social, “já ofendido moralmente a partir do fato objetivo da violação da ordem jurídica”. Segundo o ministro, o desrespeito à norma de tal natureza, que reserva cotas aos aprendizes, alcança, potencialmente, todos os trabalhadores sem experiência profissional situados na mesma localidade do estabelecimento comercial, que poderiam ser contratados pela empresa. 
Ainda, segundo o relator, ao deixar de cumprir a cota, a usina descumpriu também sua obrigação de promover a inclusão dessas pessoas e, portanto, sua função social. “É o que basta para que se caracterize o dano moral coletivo”, concluiu.
O valor da condenação será revertido para instituições e projetos ligados ao trabalho. Ficaram vencidos os ministros Maria Cristina Peduzzi, Márcio Amaro e Alexandre Ramos.
(RR/CF)
A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, composta por quatorze ministros, é o órgão revisor das decisões das Turmas e unificador da jurisprudência do TST. O quórum mínimo é de oito ministros para o julgamento de agravos, agravos regimentais e recursos de embargos contra decisões divergentes das Turmas ou destas que divirjam de entendimento da Seção de Dissídios Individuais, de Orientação Jurisprudencial ou de Súmula.
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quinta-feira, 4 de junho de 2020

STF - Trabalhadores portuários avulsos também têm direito a adicional de risco

Trabalhadores portuários avulsos também têm direito a adicional de risco

Por maioria, os ministros entenderam que a lei que prevê o pagamento da parcela aos trabalhadores com vínculo de emprego se aplica a todos os que atuam nas mesmas condições.
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (3) que o adicional de risco concedido aos trabalhadores portuários permanentes também será devido aos avulsos que trabalhem nas mesmas condições. Por maioria, a Corte acompanhou o voto do relator, ministro Edson Fachin, pelo desprovimento do Recurso Extraordinário (RE) 597124, com repercussão geral reconhecida (Tema 222).
No recurso, o Órgão de Gestão de Mão de Obra do Serviço Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina (Ogmo-PR) contestava decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que havia garantido aos trabalhadores avulsos o pagamento do adicional de 40% previsto no artigo 14 da Lei 4.860/1965, que dispõe sobre o regime de trabalho nos portos.
Princípio da igualdade
Em novembro de 2018, quando o julgamento foi iniciado, o ministro Edson Fachin observou que a Constituição Federal (artigo 7º, inciso XXXIV) prevê expressamente a igualdade de direitos entre trabalhadores com vínculo empregatício permanente e avulsos. De acordo com Fachin, uma leitura adequada da legislação que rege o setor (principalmente as Leis 4.860/1965 e 12.815/2013) à luz da Constituição Federal demonstra que o fato de os trabalhadores avulsos se sujeitarem a um regime diferenciado não pode ser usado como excludente do direito ao adicional. Na ocasião, votaram no mesmo sentido os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
Na sessão de hoje, o ministro Celso de Mello uniu-se à maioria formada e acompanhou integralmente o voto do relator, por entender que a Lei 4.860/1965 protege as duas categorias. De acordo com o decano, a confirmação do reconhecimento do direito ao adicional também aos trabalhadores avulsos privilegia o princípio constitucional da isonomia. “Se o adicional é devido a um, também deve ser pago ao outro que trabalha nas mesmas condições”, afirmou.
Circunstâncias distintas
O ministro Marco Aurélio foi o único a apresentar voto divergente. Segundo ele, circunstâncias distintas não podem ser igualadas, pois os dispositivos da norma se aplicam somente às relações jurídicas titularizadas pelos empregados que pertencem à administração dos portos organizados, e não aos trabalhadores dos terminais privativos, regidos por normas de direito privado. Para o ministro, a Constituição Federal não assegura, por si só, o adicional de risco aos trabalhadores avulsos.
A ministra Rosa Weber estava impedida.
Tese de repercussão geral
Foi aprovada a seguinte tese de repercussão geral: “Sempre que for pago ao trabalhador com vínculo permanente, o adicional de risco é devido, nos mesmos termos, ao trabalhador portuário avulso”.

STF decide que gravação clandestina em ambiente privado não pode ser usada como prova em processo eleitoral

STF decide que gravação clandestina em ambiente  privado não pode ser usada como prova em processo eleitoral   Tese fixada pelo Plenário dev...